psicologa fatima nunes
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Em 2022, os portugueses gastaram 1714 milhões de euros na compra de raspadinhas. De acordo com o relatório e contas dos Jogos Santa Casa, publicado este ano, os gastos com as lotarias instantâneas representam mais de 56% das vendas brutas dos Jogos Santa Casa. 

A compra de raspadinhas é considerada como um “vício” e a Santa Casa recebeu 274 contactos na linha de apoio ao jogo responsável, dos quais 135 receberam apoio psicológico. Fátima Nunes, psicoterapeuta e diretora clínica do Instituto do Desenvolvimento, falou sobre este “vício” e sobre a importância de procurar ajuda. 

Atualmente, a compra de raspadinhas já é considerada um comportamento aditivo, segundo a profissional. “O efeito e impacto que tem na vida das pessoas que jogam e nas suas famílias é de tal ordem destrutivo que deve ser motivo de procura de acompanhamento terapêutico”, disse, esclarecendo que “o funcionamento neurológico para este comportamento aditivo é o mesmo, ou semelhante, quando há consumo de drogas, por isso deve ser visto como preocupante e deve sofrer intervenção médica e psicoterapêutica”.

De acordo com a Santa Casa, a raspadinha é o jogo onde são atribuídos mais prémios, mais de mil milhões de euros, mas só premiou um apostador com um prémio superior a um milhão de euros. Ao longo de 2022, foram ainda distribuídos 3471 prémios de valor igual ou superior a cinco mil euros.

Para além da componente neura química da função neurológica para quem tem tendência a outros comportamentos aditivos, a parte emocional “está muito patente nestes comportamentos”, esclarece a psicoterapeuta. “Pessoas com problemas financeiros, ou com expectativa de uma vida facilitada financeiramente sem ter de trabalhar, pessoas deprimidas, ansiosas, frustradas com a vida que têm… as raspadinhas podem funcionar como um escape emocional”, acrescentou.

Antigamente, as raspadinhas eram vistas como “um jogo de reformados”, mas nos dias de hoje o vício é já “transversal a todas as faixas etárias”. O Jornal A VERDADE teve conhecimento de uma mulher, com 81 anos, que tem o hábito de comprar raspadinhas todos os dias e, muitas vezes, acaba mesmo por pedir dinheiro a outras pessoas. “A solidão e a necessidade de fazer dinheiro fácil” são alguns dos motivos que fazem com que as pessoas tenham este vício. 

Há semelhança de outros comportamentos aditivos, o consumidor “acaba por não ter perceção da gravidade e da dependências, por isso é que os familiares devem estar atentos e recorrer, de imediato, a ajuda profissional”.

Caso um familiar, amigo ou conhecido identifique comportamentos de vício associados à compra de raspadinhas, ou até mesmo a própria pessoa reconheça esse comportamento, deve “imediatamente recorrer a ajudar psicológica/psiquiátrica. Há coisas que não se deve protelar ou achar que se vão resolver por si só”, defendeu Fátima Nunes. 

A psicoterapeuta deixa uma mensagem final: “não deixem, nem adiem a procura de ajuda profissional”.

Refira-se ainda que Ana Jorge, provedora da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML), já se mostrou preocupada com o facto de haver muitos casos de dependência da raspadinha em Portugal.