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Sargento-Mor António Araújo, atual presidente do Núcleo de Penafiel da Liga dos Combatentes, tinha 21 anos quando se deu a Revolução de 25 de Abril. A vida antes e pós da Revolução dos Cravos, é “muito diferente” e “embora a sociedade atual não seja tão perfeita como desejaríamos, é muito melhor do que era naquele tempo”.

São estas as convicções de um homem que se considera parte de uma geração “de ouro”, que viveu “tempos complicados”, conseguiu “erguer-se nas fragilidades e andar para a frente” e que acompanhou “todas as evoluções do mundo entre dois séculos”.

António Araújo reconhece a importância de uma data que nos garante a “liberdade e paz que hoje vivemos”, mas alerta para alguns factos ocorridos para além da ação liderada pelo Movimento das Forças Armadas (MFA), composto, em maioria, por capitães que tinham participado na Guerra Colonial e que tiveram o apoio de oficiais milicianos.

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Golpe das Caldas – 16 de março de 1974

O 25 de abril é uma data lembrada por todos os portugueses como o dia em que Portugal ‘abraçou’ a democracia, mas a luta pela liberdade já tinha dado alguns sinais, embora que “falhados”, como foi o Golpe das Caldas , foi uma tentativa de golpe de Estado ocorrida a 16 de março de 1974.

Nessa madrugada, uma coluna de cerca de duas centenas de soldados, comandada pelo major Armando Ramos, saiu do Regimento de Infantaria 5, nas Caldas da Rainha e seguiu rumo Lisboa, para derrubar o governo de Marcello Caetano. Esperava-se o apoio de outras forças militares, mas os soldados foram informados de que nenhuma das unidades tinha iniciado qualquer movimentação. Decidiram, então, abortar o golpe e regressar ao quartel. Na chegada, foram cercados pelas forças fiéis ao regime e, após várias horas de negociações, renderam-se.

Sargento-Mor António Araújo estava “de fim de semana” e não presenciou o momento, mas em entrevista ao Jornal A VERDADE recorda a “tentativa frustrada. Falhou qualquer coisa. Esqueceram-se de avisar as Caldas da Rainha que não era para avançar. Eu tinha ido a casa e recebi uma chamada telefónica a dizer para não regressar ao quartel até nova ordem. Não presenciei, mas soube que o quartel entrou de prevenção. Contaram-me que o responsável pela região militar de Tomar foi ao quartel pedir a rendição e que os oficiais e sargentos envolvidos foram detidos. Dias depois fomos notificados para voltar ao quartel, mas já não encontramos as mesmas pessoas e ficamos surpreendidos, mas ninguém queria contar. Se, nessa altura, as outras unidades tinham vontade de fazer o Golpe de Estado, mais vontade tinham depois para retirar aqueles que estavam presos por um falhanço”, garante.

O 25 de novembro é que deu o rumo aos dias que vivemos hoje

Quando se deu a Revolução dos Cravos, o presidente do Núcleo de Penafiel da Liga dos Combatentes estava no quartel de Tavira, mas recorda que apenas no dia 29 “é que se abriram as portas. Vimos soldados com os cravos metidos na G3. Eu estava lá como instruendo”.

António Araújo vai ‘desfiando’ vários momentos daquele ano, como a Revolta dos Capitães e a formação de diferentes partidos políticos, mas destaca o 25 de novembro como o dia em que “deu o rumo aos dias que vivemos hoje”.

Mas o que o que aconteceu a 25 de novembro de 1975? Foi o resultado de tensões, políticas e ideológicas, que surgiram após o 25 de Abril de 1974, que levou à queda da ditadura, mas que dividiu forças políticas e sociais em Portugal quanto ao rumo a ser seguido.

Venceu a intervenção militar liderada pelo general Ramalho Eanes, que procurava restaurar a ordem e evitar uma possível perda para a esquerda, mais precisamente Otelo Saraiva de Carvalho, que chefiava o COPCON (Comando Operacional do Continente). Foi, também, o dia que marcou o fim do PREC – Processo Revolucionário em Curso – e o início da consolidação da democracia em Portugal.

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“Hoje devíamos era comemorar, seriamente, o 25 de novembro”, diz com toda a certeza o entrevistado, que enaltece o dia que “deu o rumo aos dias que vivemos hoje, a verdadeira democracia, e terminou com muitas das coisas que se passaram até aí. A partir dessa altura, as coisas começaram a melhorar a haver mais entendimentos entre as forças políticas”, explica.

O 25 de abril é lembrado, pelas gerações que o viveram, como um dia “muito importante” e que permite às pessoas, atualmente, “terem uma vida diferente. Falo por mim, antes do 25 de abril, tinha uns 17 anos e andava a estudar. Lembro-me que eu e os meus amigos íamos pela rua, cantarolávamos ‘viva a democracia’ e fazíamos umas brincadeiras. Éramos atrevidos e fazíamos as nossas malandrices às autoridades, mas tínhamos de nos defender. Na altura, houve um individuo da PSP, amigo do meu pai, que avisou o alertou, porque tínhamos um vizinho que diziam ser informador da PIDE. Hoje, se fizermos isso não há problema nenhum, somos livres de expressar o que pensamos”.

Era uma vida “diferente”, numa época em que “se tinha de lutar por qualquer coisa, nem que fosse para sobreviver e comer” Hoje, “a pessoa pode não ter, mas parece que o Estado tem obrigação de dar. Antigamente, podia ser como fosse mas os portugueses eram dependentes de si próprios, não deviam nada ao estrangeiro, pelo contrário, tínhamos um banco de Portugal cheio de ouro e sustentamos uma Guerra do Ultramar durante 14 anos. Agora, estamos em paz mas com a ‘corda ao pescoço’, porque dependemos da União Europeia”, lamenta.

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Sentado na secretária, António Araújo admite que a evolução “é muito boa para quem souber viver nela, mas também pode ser muito má”, enquanto assiste a uma sociedade “com muito stress, não sei se será pior do que a guerra“.

As diferenças estendem-se também à independência financeira dos mais jovens. “Aos 14 anos tentei sair de casa para ter a minha independência, eu tinha 14 irmãos, o meu pai não tinha dinheiro para sustentar todos. Hoje, os filhos só saem quase aos 40 anos e se saírem a ‘torneira’ fica sempre aberta. São vidas totalmente diferente. não há dúvida que hoje a vida é boa, mas tenho muito medo do futuro”.

A finalizar a conversa e já na despedida de uma conversa que o fez relembrar tempos antigos, António Araújo diz sentir-se “feliz” por ter vivido tudo o que já viveu. “Mas temos de ser realistas em relação ao que estamos a viver. Hoje, somos muito felizes, não nos falta nada, mas temos de ter mais paciência e trabalhar por aquilo que queremos”, termina.