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José Sousa foi o ferido mais grave do acidente com o carro dos Bombeiros de Vila Meã na serra na Serra do Marão.

O dia 22 de agosto de 2023 ficará, para sempre, na memória de José Sousa. Era um dia comum de serviço nos Bombeiros Voluntários de Vila Meã, estava em Baião num incêndio que lavrava naquele concelho,
quando tudo aconteceu: o veículo que conduzia despistou-se, capotou e deslizou por um percurso de cerca de 300 metros.

Descrito por muitos como “um verdadeiro milagre” ou “sorte”, José Sousa defende que foi a “segurança” um dos motivos por não ter perdido a vida neste acidente. Era um dia “em que as previsões já marcavam como muito quente” e, da parte da manhã, tinha sido chamado para uma queima. “Hoje, isso, está-me na memória. Como é possível continuarmos a ter pessoas que, de forma negligente, continuam a utilizar o fogo em pleno dia de verão e de calor”, lamentou.

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A equipa da qual fazia parte seguiu, então, para Baião para substituir uma outra que tinha estado lá durante a noite. Tudo aconteceu cerca das 13h40. “Foi tudo muito rápido, estava a fazer inversão
de marcha e o carro começou a deslizar e nunca mais consegui controlá-lo. Era um local muito íngreme, não havia qualquer hipótese, foram muitos metros a deslizar, a tombar e a capotar. O acidente foi muito violento”
, recorda.

Após o carro parar, a única preocupação de José Sousa foi encontrar os colegas. “A primeira coisa que me veio à cabeça foi que os meus colegas estavam mortos, porque tinha sido muito violento. Tive forças para sair da viatura, o que não devia ter feito, e consegui visualizar a minha colega Lúcia, que estava a uns metros de onde me encontrava, mas não consegui ver a Ana e o Miguel. Quando não os encontrei e não os ouvia, só achei que estavam mortos. A dor física, mental, a responsabilidade como condutor, pensar que tinha causado a morte destes meus colegas, foram minutos terríveis que ninguém consegue imaginar. Aí tive momentos em que pedi para morrer, o desespero era tanto, a dor física, que começou a aumentar, era tanta. Fiquei parado a olhar para a minha colega e a pedir para morrer”, descreveu.

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Apenas conseguiu acreditar que os colegas estavam bem quando a esposa lhe disse para acreditar. “Os comandantes e os meus colegas diziam que eles estavam bem, mas não acreditava. Só consegui ficar aliviado quando os vi no hospital”. Para além dos quatro ocupantes da viatura, no local estava também o “chefe Teixeira” que tinha saído do veículo para ajudar na manobra. “Ainda bem que não estava no carro”, acrescentou.

Na proximidade do acidente, e devido ao incêndio que lavrava em Baião, encontravam-se vários bombeiros, que “rapidamente chegaram ao local. Fui o primeiro a ser evacuado para o hospital. Fui o que fiquei em estado pior, e sabendo isso, para mim foi uma alegria, de uma certa forma, porque eles estavam melhores do que eu, para mim isso foi um conforto”.

Medo de deixar de andar era real

José Sousa teve fraturas na coluna, na D6, D9 e D12, tendo sido intervencionado com uma cirurgia à D12, com a colocação de seis parafusos. “Tive a fratura também de seis costelas do lado esquerdo e um pneumomediastino pequeno. Depois da cirurgia fui para os cuidados intermédios, onde estive dois dias. Tive sete dias no hospital, obviamente que estes dias foram terríveis”, descreve.

A incerteza se iria voltar a andar era uma constante e só no sábado depois do acidente, passado cinco dias, é que fez o teste. “Fiz o chamado levante e esse momento também foi muito marcante, saber se ia conseguir ou não andar. Foi um momento preparado, com colete, com a ajuda de toda a gente, consegui fazê-lo à primeira e consegui andar. Foi um alívio, quando me apercebi que conseguia andar, foi quase um renascer. Todos os médicos disseram que eu tinha tido muita sorte”, referiu.

José Sousa contou com o “apoio imprescindível” da esposa, bem como da família e dos amigos. “No início foi muito complicado, não conseguia fazer nada sozinho. A minha esposa teve um papel fundamental. O nosso orgulho e aquela ideia de que somos imbatíveis, de que não precisamos de ninguém, desaparece, porque as outras pessoas são muito importantes”, garantiu.

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O colete foi companheiro durante três meses e, atualmente, já não faz parte da vida de José Sousa. A fisioterapia é algo que faz diariamente, bem como as caminhadas. “A fisioterapia é essencial, não só
para a parte da coluna, mas também para a parte respiratória que ficou muito afetada”
, sublinhou.

A nível de sequelas, o bombeiro refere que “estão presentes”, sendo que os médicos garantem que vai ficar bem. “Poderei fazer tudo, ou quase tudo, o que fazia. Não me estou a ver a não poder fazer aquilo que fazia nos bombeiros. Cada vez dou mais valor ao sentido de ajudar os outros e por isso é que vou continuar no voluntariado, se conseguir”, disse.

Os “momentos de terror” vividos, continuam muito presentes na mente de José Sousa, que acredita que “vão ficar para sempre”, mas defende que “vai acabar por ficar apenas uma memória menos boa”.

“Ser bombeiro é o meu escape, é a minha tábua de salvação”

Após receber alta, José Sousa teve de passar pelo quartel dos Bombeiros de Vila Meã. Ao chegar, sentiu “um pouco de medo”, mas ao mesmo tempo foi “um sentimento de voltar à casa que adoro. Receber o abraço dos meus colegas foi essencial”.

É bombeiro há 20 anos e garante que faz todo o trabalho “com muita dedicação. Aquilo é a minha vida, tenho a minha profissão, que adoro, mas aquilo é o meu escape, é a minha tábua de salvação”. De acordo com José Sousa, o risco do acidente foi minimizado devido aos ‘roll bars’ existentes no veículo. “Se não fossem essas barras, eu provavelmente não estaria aqui. Apesar de ficarem danificados, foi essencial para o interior da viatura não ficar tão danificada. É um apelo e uma mensagem que deixo ao poder estatal, porque continuam a existir muitas viaturas nos incêndios florestais sem estes roll bars. É importante que todos estejam munidos deste material, que neste caso, salvou quatro vidas”.

O bombeiro, ainda em recuperação, deixou vários agradecimentos: “à minha esposa, à minha família, aos bombeiros e, em especial, ao chefe Teixeira, à Ana, ao Miguel e à Lúcia que viveram este drama. A todas as pessoas que estiveram no Teatro de Operações, ao hospital de Penafiel, a todos os que me foram visitar e que me deram um apoio extraordinário, todas as entidades, em especial o D. Américo Aguiar cujas palavras foram essenciais. Mas a todos, sem exceção, por terem estado comigo nestes momentos mais difíceis”.

Para José Sousa, o ensinamento que fica é de “não poder desistir. Sou louco pelos bombeiros e não vou desistir nunca, apesar das adversidades. Temos de enfrentar e lutar pela vida, já que o lema dos
bombeiros é vida por vida, vou continuar a dar a vida por mim e pelos outros”
.