As viagens para a Família Natal começavam muito cedo, apesar do Natal só acontecer em dezembro. Dependendo dos países ou até das famílias as prendas trocavam-se na noite de 24 para 25 ou na manhã de 25 de dezembro. Noite mágica era a noite da consoada, dia mágico era o dia de Natal para a Humanidade. Era? Assim, deveria ser para todos, mas… o mundo que todos os dias sorri, chora, também, todos os dias.
Seja como for a Família Natal: o Pai Natal, a Mãe Natal e as Filhas e os Filhos Natal todos os anos preparavam as prendas desde abril, respondendo a todas as cartas que recebiam. Em novembro começavam as viagens. Felizmente, no século XXI tudo era mais fácil: a Família Natal viajava pelo mundo de avião, fazendo as suas entregas. Tudo estava organizado. Quando a Família Natal chegava aos aeroportos, seguia sempre a mesma rotina. Primeiro, saía do avião, depois passava a emigração, seguidamente, levantava as bagagens e a saía do aeroporto.
A partir daí a magia acontecia: a família tornava-se invisível e procedia às entregas das prendas chaminé a chaminé, porta a porta, janela a janela conforme os casos. A operação Natal repetia- -se por todo o planeta Terra para que o maior número possível de pessoas pudesse ver os seus desejos concretizados. Pouco a pouco as prendas tornavam-se visíveis nos sapatinhos, nas meias, nos presépios, debaixo das árvores de Natal, mais uma vez tudo acontecia conforme as tradições familiares. Cada Natal era uma festa, para quem conseguia escrever uma carta à Família Natal.
Antes de continuar, eu, o narrador desta história, (só estou a contar a história, porque não tenho pernas para acompanhar esta azáfama natalícia) preciso de fazer uma paragem nesta narração. Descrição? Não, caros leitores, não vou descrever coisíssima nenhuma. Vou prestar-vos alguns esclarecimentos em nome da coerência e da coesão natalícia. Aqui vão eles, os esclarecimentos:
1.º Ao contrário do que se quer fazer pensar aos mais pequeninos, o Pai Natal não chega para as encomendas, é-lhe impossível chegar a todos os cantinhos do planeta.
2.º Não se sabe exatamente como começou, mas a distribuição das prendas é organizada ao longo do ano e a família Natal seleciona as famílias mais corajosas e generosas para proceder à entrega das prendas.
3.º Cada ano a família Natal escolhe um país e cumpre com distinção a sua função concretizando desejos.
Tudo correu como previsto à família Natal até 2022. No ano seguinte, 2023, a Família Natal tinha escolhido como destino principal, desse ano Portugal. O aeroporto de destino era o aeroporto Francisco Sá Carneiro, no Porto. Toda a distribuição dos presentes seria realizada de Norte para Sul, garantindo que no dia 25 a Família Natal descansaria em terras Algarvias, usufruindo do merecido descanso num clima mais ameno. Como acontecia normalmente, a Família Natal chegava primeiro ao seu destino e após o levantamento da bagagem contactava os seus colaboradores, dando ordens para o início da distribuição.
Após a aterragem, como já tinha dito, a Família Natal tornava-se invisível, mas mesmo invisível cumpria os procedimentos habituais à chegada aos aeroportos até ao levantamento da bagagem fazia. Ainda que, aparentemente, tudo tivesse acontecido como habitual, o pior dos imprevistos, para quem viaja, tornou-se realidade para a Família Natal e respetivos colaboradores: a bagagem com as prendas a distribuir tinha desaparecido. Natal é tradição, mas há muito que a família Natal e os seus colaboradores usam os seus telemóveis como ferramenta de comunicação imprescindível. O alerta disparou no grupo de WhatsApp da FamíliaNatal23:
Prendas desaparecem! O que fazer? Respondam urgente, diziam os colaboradores de todos os cantos e recantos do mundo.
O Pai Natal, a Mãe Natal, os Filhos Natal e as Filhas Natal estavam incrédulos, talvez em estado de choque…Não demorou muito a que a Mãe Natal colocasse uma mensagem no grupo:
Caros Colaboradores,
Daremos uma resposta sobre as ações a realizar dentro de uma hora.
Aproveitem para descansar e usufruir do vosso estado invisível, voando pelas vossas cidades. Até já,
Família Natal.
A família Natal tinha agora uma hora para decidir como salvar o Natal de 2023. Uma hora para resolver o impossível. Uma hora para salvar o Natal. E que hora foi aquela… Chorou-se, gritou se, riu-se, conversou-se…A família Natal andava num rodopio, numa verdadeira montanha russa de emoções…faltavam 15 minutos para dar uma resposta e o desespero era evidente. De repente, os filhos e as filhas Natal começaram a reler as cartas. Passavam os dedos nos ecrãs dos telemóveis, lendo, lendo, lendo…quanto mais liam, mais se acalmavam e de repente começaram a dizer palavras:
Fé
Amor
Saúde
Respeito
Bondade
Carinho
Perdão
Amizade
Coragem
Tranquilidade
Felicidade
Fidelidade
Lealdade
Harmonia
Educação
Alegria
Simpatia
Inteligência
Humildade
Liberdade
Tolerância
Paciência
Resiliência
Entreajuda
Solidariedade
Gratidão
Persistência
Empatia
Compreensão
Iam dizendo as palavras e a cada palavra uma força inabalável tomava conta da Família Natal. Subitamente, de olhos agigantados e brilhantes, os filhos e as filhas Natal iam dizendo:
– Vamos dar às famílias o que mais precisam: olhem, por exemplo a família Silva precisa de saúde! – Sim, e a família Pereira precisa de amor!
– E a Família Rodrigues precisa de Coragem!
– E os Azevedo precisam de Compreensão!
– Vamos dar prendas à humanidade, para tornarmos o nosso mundo um lugar melhor!
O Pai Natal e a Mãe Natal emocionaram-se! Não demoraram muito a concordar com os filhos: urgente não era receber bens materiais: urgente era deixar as pessoas mais felizes com o que verdadeiramente lhes fazia falta.