Adélia Carvalho nasceu e cresceu na companhia de um contador de histórias: o avô. Natural da antiga freguesia de Vila Cova, concelho de Penafiel, a escritora foi inspirada pelas histórias da sua “figura protetora”. Os anos passaram, e o avô Francisco acabou por falecer, mas ficou omnipresente na memória e na escrita da neta.
A escritora defende que “tudo o que nós somos vem da infância” e que o “fascínio” pelas histórias também marcou as suas opções de vida e desenvolveu capacidades como “imaginação, competências literárias e gosto pela ficção”.
Desde 2008, que Adélia Carvalho se dedica à escrita de forma profissional e tenta provocar emoções nas crianças e pais, defendendo que ter acesso à cultura “faz toda a diferença. Ter acesso à cultura é ter mais oportunidades de vir a gostar de fazer coisas É no aprofundamento que gostamos da arte, quando choramos com um filme é porque algo nos aconteceu interiormente que nos fez chorar. Como é o caso do humor, muito importante, nomeadamente, nas crianças, para entenderem o mundo e darem lugar a vários tipos de pensamentos”. No fundo, contactar com o mundo das artes, incluindo a leitura e escrita é “abrir mentes”.
A escritora procurou e, ainda procura, toda a sua vida pelo conhecimento para expandir horizontes. Embora tenha nascido numa aldeia, lugar onde o “gosto pelas artes não é tão comum. Aliás, temos uma consciência de uma arte mais intrínseca, pela questão da contemplação da natureza, que leva a uma reflexão interior sobre o mundo. As aldeias são boas para isso, depois o gosto pela arte foi crescendo à medida que fui crescendo também e tendo acesso às coisas”. Mesmo assim, a penafidelense era uma criança curiosa e, desde cedo, que se envolvia em “todas as pequenas atividades” da aldeia.
Quando cresceu, Adélia Carvalho inspirou-se nas histórias que o avô contava e decidiu investir na literatura infanto-juvenil. Um caminho onde sente que “a noção de literatura é mais presente, porque é uma opção despojada de muita coisa que às vezes a escrita para adultos não é. A literatura para a infância é um lugar mais puro”.
Em cada ato de escrita, Adélia Carvalho tem uma possibilidade de “fuga”, uma sensação semelhante à que sentia quando o avô a envolvia nas suas histórias. “Saímos da realidade e essa necessidade de evasão interior e de termos mais algo do que não só a realidade é fundamental”.
No entanto, a escritora relembra que escrever para a infância “é exigente. Existe um campo de experimentação muito grande, requer uma capacidade de imaginação muito grande, porque são narrativas curtas e, depois, o domínio da linguagem. É necessário despertar a interrogação, o espantamento e isso requer muito domínio, porque em pouco espaço temos de ter uma série de estratagemas para agradar”.
Um agradar que tem de ser realizado, na sua visão, em dose dupla. “Um bom livro para a infância tem de servir às crianças e aos pais”, defende.
Empenhada em transmitir as emoções dos seus livros ao leitores, Adélia Carvalho continua a ter presentes as “recordações” do seu avô, sinónimo de “contador de histórias, amigo, companheiro e cúmplice. Os nosso familiares que já partiram só morrem quando a gente deixar de se lembrar deles, se não vão ser sempre eternos”, relembra a escritora para terminar.