carla mendes
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As memórias são de uma infância marcada pela violência exercida “pela mãe” e pela ausência do conforto familiar quando foi “retirada” aos pais com apenas 11 anos. Mas são, também, de uma vida de “difícil e complicada”.

Carla Mendes, natural de Vila Boa de Quires e Maureles, decidiu passar para o livro “Um sonho de menina” todas essas memórias e partilhar o testemunho com todos aqueles que se identificam com a sua história.

Aos 23 anos, “grávida de sete meses do filho Pedro e com uma filha (Filipa) de dois anos”, foi “abandonada” pelo companheiro. “Foi complicado e difícil, não tinha dinheiro, porque ele era o único que trabalhava. Fiquei sozinha e passei fome. A única pessoa que cuidava de mim e me dava carinho era a minha avó de 83 anos”.

Ligada às máquinas, só pensava que podia não ver mais os meus filhos.

Os problemas não se ficaram por aqui. Quinze dias após o nascimento do segundo filho, Carla Mendes esteve 11 dias nos cuidados intensivos e ficou três meses internada. “Estive entre a vida e a morte, numa cama do hospital e os meus filhos andavam de mão em mão. Depois de alguns exames, disseram-me que tinha tido uma trombose. Ligada às máquinas, só pensava que podia não ver mais os meus filhos. Pedia ajuda a Deus, porque já tinha sofrido tanto na infância e estava a passar por tudo aquilo. Dormir era impossível, só pensava nos meus filhos”, recorda a marcoense.

Dessa altura, guarda uma frase de uma médica, “muito querida”, que lhe disse: ‘Está o hospital todo a pensar em ti’. Fiquei com aquela frase na minha cabeça e senti esperança e percebi o amor que sentia pelos meus filhos. Eram e serão o amor da minha vida”.

Durante aquele tempo, os filhos foram entregues a uma família de acolhimento em Baião, mas Carla não descansou e após melhorar conseguiu recuperá-los. “Quando a proteção de menores veio ter comigo percebi logo que ia acontecer algo. Fomos para uma sala e ali vi que não tinha escolha. Estava doente e não podia cuidar deles. Tive de enfrentar a realidade“.

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Chegou o dia de se despedir dos filhos e foi um reviver do que tinha passado na infância. “Veio-me à memória o que a minha mãe passou e eu ali de novo“. Agarrou-se à “fé” para preencher “o vazio. Sentia uma dor tão grande por não ter os meus filhos comigo. Ia vê-los duas vezes por semana e sabia que eram bem tratados” por uma senhora, a quem hoje deixa um “agradecimento“.

Mais tarde, e já recuperada, voltou a ter os filhos perto de si e foi “como nascer de novo. Não me vejo sem eles eles, são tudo para mim. Prefiro sofrer do que ficar sem os ver. Lutei sempre e, até hoje, estão comigo”, diz orgulhosa.

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Escrita foi uma “terapia” para Carla Mendes

Em 2023, lançou o primeiro livro, “um sonho que demorou 14 anos a ser realizado“. A obra surgiu depois da saída do hospital, e num momento de “muita dor e tristeza”, a escrita foi “uma terapia. Ao escrever apercebi-me de que nos meus textos e poemas havia sempre amor”.

O livro fala de uma menina “que só queria amor das pessoas, mas nunca concretizou esse desejo. Era tão ingénua, que acreditava na mudança das pessoas. 14 anos depois o objetivo é ajudar aquelas pessoas que têm o coração ferido e sem esperança”, é o desejo da marcoense.