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Sofia Teixeira é professora de português e inglês, desde 2004, e é também a voz de milhares de professores portugueses que, tal como ela, reclamam pela “valorização da profissão e efetivação de professores que lecionam há muitos anos”.

Com quase 20 anos de carreira, o que há para mudar está claro na perspetiva da professora, assim como a “incerteza. Ano após ano terminam as aulas, o nosso contrato acaba a 31 de agosto, e não sabemos para onde vamos. Ficamos dependentes  de um subsídio de desemprego, o que é muito grave, porque já devíamos  ter alguma estabilidade. Eu tenho 40 anos e estabilidade zero”, reclama.

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Desde que começou a dar aulas até aos dias de hoje, Sofia Teixeira pertence à classe dos professores contratados “por escolha própria. Temos a opção de ficarmos longe de casa ou ficar perto e andar em várias escolas. Eu optei por não concorrer para longe, mas sim para onde sei que posso ir”. Uma opção que não deixa feliz, uma vez que fica “sujeita a horários temporários, ou seja, substituições. Aquilo que pode acontecer é corrermos várias escolas durante um ano letivo e não conseguimos organizar a nossa vida”.

Por isso, a motivação “não é a mesma” que tinha no início de carreira, “sem dúvida. O sonho e a magia de ser professor é o próprio Ministério da Educação que nos tira, com todas as manobras que faz. É impossível não ficarmos abalados com as situações que vivemos”, diz emocionada.

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“O poder e respeito que tínhamos na sala de aula foi-nos roubado e isso trouxe falta de educação e desrespeito”

Uma insatisfação que leva Sofia Teixeira a afirmar que “se fosse hoje já não escolheria a profissão. Gosto muito do que faço, dos meus alunos, do contacto com os encarregados de educação, mas (o ministério da educação) tratam-nos muito mal e temos perdido muitos direitos. Se o tempo voltasse atrás eu nunca, mas nunca seria professora, por causa deste sistema que tem destruído a magia de ser professor”.

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Muitas foram as mudanças na profissão ao longo dos anos. Burocracia é uma delas. “Todos os anos há uma novidade e temos de apresentar números e metas a cumprir, que o ministério nos traça. Somos torturados com trabalho burocrático”, descreve a professora que aponta também para a mudança de comportamento dos alunos nestes 20 anos de profissão. “O poder e respeito que tínhamos na sala de aula foi-nos roubado e isso trouxe falta de educação e desrespeito. A opinião pública vê a forma como somos tratados e isso faz com que os alunos nos venham a tratar da mesma forma. É uma bola de neve”.

Conciliar a profissão com a gestão familiar

Apesar de gostar de ser professora, Sofia Teixeira não tem dúvidas de que “gostar não é tudo”, é preciso, também, que sejam dadas “as condições e ferramentas para trabalhar e não temos nada disso”. No seu caso, mãe de uma menina com sete anos, garante que “não existe flexibilidade nenhuma. No ano passado, quando fiquei colocada, apresentaram-me um horário noturno. Tive de entrar numa luta com a direção, porque não me queria alterar o horário. Estou sozinha durante a semana com ela. o pai trabalha fora e é doente oncológico, está em remissão mas tem as suas dificuldades. Não foi nada fácil, porque foi uma luta que durou de setembro a fevereiro, só aí alteraram o horário. Tal como em todas as profissões temos direito a um horário flexível quando temos filhos menores de 12 anos, muitas vezes o pedido é negado e não compreensão”, conta.

“Não há falta de professores, há sim falta de condições para exercer a profissão”

Neste ano letivo, Sofia Teixeira ficou colocada numa escola em regime de substituição. É um futuro “incerto e desgastante psicologicamente. Gerir todas as emoções é muito complicado. Temos um horário, organizamos a vida familiar, as atividades dos nossos filhos de acordo com o horário. Passados dois meses, somos colocados noutro horário e temos de voltar a organizar novamente. Ninguém consegue viver assim”, partilha.

Quanto à falta de professores, a experiência de 20 anos de professora levam-na a afirmar que “não há falta de professores, há sim falta de condições para exercer a profissão. Chegamos a um ponto que não nos sujeitamos a qualquer coisa. Este ano, por exemplo, houve muito menos professores a concorrer para os horários de 8 e 14 horas. Temos de ter consciência que esses horários não dão um salário mínimo. Para uma pessoa que tem uma família, que tem de pagar deslocações, almoços, não dá”, frisa.

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No futuro, a situação da carreira de professor “tem tendência a piorar” e, por isso, Sofia Teixeira está certa de que é preciso que todos “se revoltem contra a  falta de condições. Se nos unirmos, temos tudo para que a luta dê frutos. Caso contrário, vai piorar”.

Este é um cenário que a professora não quer rever no futuro da filha. “Espero que a minha filha nunca me diga que quer ser professora. Se me disser não vou deixar. Eu sei que devemos deixá-los seguir os seus sonhos, mas eu não a vou deixar seguir um sonho para ir ao caminho do sofrimento”.