agostinho marques
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Este outono assistimos mais uma vez a enorme pressão sobre os serviços de atendimento ao público na área da saúde. As notícias falam de longos períodos de espera nas urgências hospitalares, mas é generalizada a todos os tipos de serviços de atendimento dos setores público, social e privado. O que causa este excesso de movimento são infeções respiratórias agudas, gripe, rinofaringites banais (constipações) e casos de COVID que se vêm somar ao movimento habitual.

Porque há tantas infeções respiratórias este ano? As medidas de isolamento social, #fiqueemcasa#, e o uso generalizado de máscara cobram agora o seu preço. Durante 2 anos houve muito menor número de infeções, não se renovando a imunização natural que essas infeções vão fazendo, de modo que chegamos agora ao período outonal muito mais vulneráveis para adoecer. O facto das mulheres grávidas terem estado protegidas de infeções durante este período, reduziu a sua imunização e por essa razão, a passagem de anticorpos para os respetivos descendentes. Está aí parte da explicação para o aumento de bronquiolites este ano. Este fenómeno é bem conhecido e era esperado. Será um inverno particularmente gravoso para todos nós, jovens e velhos. No fundo estamos a viver um período habitual de infeções sazonais, ampliado pelo preço a pagar por um combate excessivo à COVID.

Mas sejamos claros. Todos os anos com maior ou menor intensidade passamos por este tipo de crises. Como se compreende que o SNS não responda com eficácia a um fenómeno tão repetido?

A resposta é simples. O SNS está construído em rede, com cuidados primários e serviços de cuidados diferenciados (hospitais). O cidadão deve procurar e ser atendido em primeiro lugar nos cuidados primários. Mas estas unidades estão dimensionadas para atender a população a fluxo constante, em consultas programadas, dispondo de um tempo limitado para consultas urgentes. As Unidades de Saúde Familiar (USF), em particular, são avaliadas e remuneradas de acordo com regras que valorizam esta atividade regular. Quando há excesso de procura, esta resposta no ambulatório esgota imediatamente, sobretudo para doenças respiratórias de curta duração que requerem cuidados no próprio dia. Sem resposta a este nível, os doentes vão procurar ajuda nos únicos lugares onde sabem que há uma porta aberta 24 horas por dia, ainda por cima com condições para fazer exames complementares de diagnóstico imediatamente.

Compreende-se que, sem alterar a estrutura dos serviços, nunca haverá resposta adequada para este fenómeno cíclico. Se a isto acrescentarmos a diminuição de profissionais de saúde que têm vindo a deixar o SNS, não fica espaço para surpresas.

Artigo de J. Agostinho Marques
Pneumologista
Diretor Clínico da Santa Casa da Misericórdia de Marco de Canaveses