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Neste dia 20 de março, celebramos o Dia Mundial do Rewilding, e o tema deste ano, “Rewilding Juntos”, ressoa profundamente com a necessidade urgente de uma ação coletiva para restaurar os ecossistemas degradados da Europa. A recente aprovação da Lei de Restauro da Natureza pelo Parlamento Europeu representa um marco histórico para a reversão do declínio da biodiversidade e para a adaptação às alterações climáticas. Agora, é crucial que Portugal traduza esta legislação em normas nacionais eficazes e significativas, capazes de catalisar a recuperação de habitats e espécies.

A Lei de Restauro da Natureza estabelece metas ambiciosas, como o restauro de 20% dos ecossistemas terrestres e marinhos da UE até 2030 e a recuperação de habitats essenciais, como florestas e rios. Para Portugal, esta legislação é uma oportunidade única para reverter décadas de degradação ambiental e falta de ambição política. A sua implementação exigirá uma abordagem estratégica, baseada na ciência e na colaboração entre o governo, organizações não-governamentais, comunidades locais e o setor privado.

É aqui que o rewilding, ou renaturalização, se revela uma ferramenta poderosa. Ao permitir que a natureza se regenere por si própria, com intervenções humanas mínimas e estratégicas, o rewilding pode acelerar a recuperação de ecossistemas e trazer de volta espécies-chave que desempenham papéis vitais no equilíbrio ecológico. Em Portugal, já estamos a ver os benefícios desta abordagem. Por exemplo, no Grande Vale do Côa, a reintrodução de herbívoros selvagens, como cavalos de raça Sorraia, está a ajudar a prevenir incêndios florestais e a promover a biodiversidade. Ao criar corredores ecológicos que permitem a movimentação de espécies e a coexistência com atividades humanas, a Rewilding Portugal está empenhada em demonstrar como o rewilding pode dar resposta a muitas das metas da Lei de Restauro da Natureza.

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Créditos: Cláudio Noy

Para que esta e outras iniciativas tenham um impacto verdadeiramente transformador, é essencial que a transposição da Lei de Restauro da Natureza para o direito nacional seja feita de forma clara, ambiciosa e prática. O Despacho n.º 12734/2024, publicado no Diário da República, reconhece a importância de alinhar as políticas nacionais com os objetivos europeus. Este é um passo importante, mas precisamos de garantir que as medidas adotadas sejam suficientemente robustas para enfrentar os desafios específicos de Portugal, como a desertificação, os incêndios florestais e a perda de habitats críticos.

É fundamental que as autoridades nacionais abracem medidas de restauro ambiciosas, como a reintrodução de espécies selvagens nativas mas localmente extintas, e deixem de bloquear os esforços de conservação e restauro liderados por organizações não-governamentais (ONGs). A reintrodução e translocação de espécies-chave, como a cabra-montesa, o castor ou até o urso-pardo, são essenciais para o restauro de ecossistemas funcionais em Portugal.

Infelizmente, os processos burocráticos excessivos e a falta de apoio institucional dificultam ou até impedem iniciativas que poderiam ajudar a atingir os objetivos da nova lei. É urgente que o governo português adote uma postura mais colaborativa, simplificando procedimentos e apoiando ativamente os projetos de ONGs que estão na linha da frente do restauro ecológico.

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Créditos: Nelleke de Weerd

A designação de 10% do território como áreas de proteção estrita é outro dos objetivos cruciais da nova lei. A Rewilding Portugal está a contribuir ativamente para esta meta, através da criação e gestão de áreas rewilding, onde a natureza pode regenerar-se com intervenção humana mínima. Estas áreas não só servem como refúgios para espécies ameaçadas, mas também como laboratórios vivos que demonstram os benefícios do rewilding para o restauro ecológico e a resiliência climática.

Para alcançar a meta dos 10%, é essencial que o governo português reconheça e apoie iniciativas como estas, integrando-as numa estratégia nacional coerente e ambiciosa. Além disso, o Estado deve assumir um papel mais ativo na aquisição de terrenos para conservação, criando áreas protegidas pertencentes ao estado, que complementem os esforços das ONGs. A proteção estrita de áreas-chave é um investimento no futuro do nosso país, garantindo que as gerações futuras possam usufruir de um património natural rico e vibrante.

Neste Dia Mundial do Rewilding, apelo a todos os portugueses para que se juntem a este movimento. O restauro da natureza não é apenas uma responsabilidade do governo ou das organizações ambientais – é um esforço coletivo que exige o envolvimento de todos. Juntos, podemos garantir que a Lei de Restauro da Natureza seja implementada de forma eficaz, e que as nossas paisagens e espécies possam florescer novamente.

O rewilding não é apenas uma solução para a crise ecológica – é uma visão de um futuro onde os seres humanos e a natureza coexistem em harmonia. Vamos trabalhar juntos para tornar essa visão uma realidade.

Artigo de Pedro Prata, líder da Equipa da Rewilding Portugal