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A ideia de que para criar é preciso destruir, não é de agora, mas é sintomática de perversão social em torno de uma classe. Existe, portanto, a ideia de que a arte será mais bem conseguida se vier do caos, sobretudo do caos psicológico do artista que a constrói. O artista será à partida “desequilibrado”, aos olhos de uma sociedade cega.

Como usual, existem sempre rastilhos para a criação mitológica. Aristoteles dizia que não existe um grande génio sem uma pitada de loucura. A quantidade de artistas que padeceram de doenças mentais ao longo da história é também assinalável, mas ainda mais será a quantidade de artistas que sofreram de constipação. É evidente, parece-me, que a classe artística, sendo constituída por humanos, adquira as mesmas doenças que a restante raça humana. Seria muito fácil se soubéssemos que bastaria apenas um desequilíbrio químico cerebral para termos meio caminho andado para criar algo sólido

Não pretendo de todo defender a tese que a arte se faz a partir do equilíbrio, mas sim defender que não há formulações corretas ou absolutas que definam uma necessidade de estado mental para a criação artística. A criação, em si, é mais complexa do que isso, e é essa complexidade que gera um mar de preconceitos: tendemos a julgar muito rapidamente aquilo que nos parece de demorada compreensão.
Observo, neste meio, uma vontade de questionar, de refletir e sobretudo uma inquietação latente sobre aquilo que estará por vir. Essa forma de estar, antagónica ao conformismo pouco saudável, repele aqueles que se deleitam a viver de forma prescrita. Contudo, coloca também uma classe inteira numa situação complicada, pois quem devia financiar a arte sabe da inquietação dos artistas e sabe que eles irão criar de qualquer forma. Assim, cria-se a prática comum de não pagar devidamente a quem se dedica a fazer arte

A verdade é que uma peça de arte pressupõe trabalho e esforço. Requer anos de dedicação e disciplina do artista que a criou, assim como do artista que muitas vezes a executa. Cunhar um artista como desequilibrado, não lhe pagar devidamente e não o ouvir porque “enfim, é artista”, pode, isso sim, fazer moça na saúde mental. Ouçam quem faz arte, não os julguem!

Texto de opinião de Rodrigo Cardoso