ukraineMature Hands in Pray Gesture on the Dirty National flag of Ukraine
Publicidade

A guerra na Ucrânia tem já mais de três meses e estamos longe de vislumbrar o fim dos combates. A Rússia acreditava que alcançaria com relativa facilidade os seus objectivos políticos e militares, que iam muito para lá da denominada região do Donbas, mas não contava certamente com a reacção enérgica dos ucranianos e com o apoio que os países ocidentais prontamente prestaram ao país agredido.

O exemplo de coragem e determinação que chegava da Ucrânia e as imagens devastadoras de morte e destruição provocaram um clamor emocional, fazendo com que as opiniões públicas pressionassem os governos e ajudassem a ultrapassar as reticências de alguns países no apoio financeiro e militar à Ucrânia.

Num curto período de tempo, Putin fez mais pelo reforço da NATO e pela escalada do investimento em meios de defesa dos países que integram a Aliança Atlântica do que anos e anos de discussão em torno dos fins e limites da NATO. Entre outros casos emblemáticos, vimos a Alemanha decidir reforçar o seu orçamento de defesa como nunca o fizera desde a II Guerra Mundial e assistimos aos pedidos urgentes de adesão à NATO de Finlândia e Suécia.

Nesta guerra não há lugar para meias palavras: a Rússia invadiu um estado soberano, matou, destruiu e pretende colocar sob sua jurisdição boa parte do território da Ucrânia, oito anos depois de já ter ocupado a península da Crimeia. Os que vêm dizendo que a NATO e os EUA contribuíram para esta situação com os seus avanços na Europa de Leste esquecem que nada justifica a invasão de um país por parte de outro. De resto, os acordos que vários países fizeram com a NATO ocorreram por livre determinação desses Estados, que assim se julgavam mais protegidos. A invasão perpetrada pela Rússia na Ucrânia só lhes veio dar razão.

Aqui chegados, o que fazer para encontrar a paz? A necessidade de encontrar resposta para esta questão começa a colocar-se com acuidade, uma vez que a guerra não pode prolongar-se indefinidamente. Seja pelas populações e pelos países envolvidos, seja pelos efeitos dramáticos que isso poderá provocar em vários cantos do globo, atendendo ao facto de Rússia e Ucrânia serem responsáveis pelo abastecimento de cereais essenciais a boa parte dos países menos desenvolvidos, particularmente em África.

O caminho da paz não é fácil de delinear e ninguém parece ter soluções capazes de sentar as partes à mesa. Aqueles que, por simpatia ou cinismo político, defendem que a Rússia terá de ganhar algo (Donbas?) para acabar com a guerra e que não pode sair humilhada parecem olvidar que isso seria beneficiar o infractor. Nesse caso, qualquer país que tivesse diferendos territoriais com outro ganharia um alento suplementar para novas investidas militares. Na Europa, na Ásia, em África…

Por outro lado, querer apoiar as posições da Ucrânia ao ponto de insistir no total restabelecimento do território soberano de 2013, com a reintegração da Crimeia, poderia até ser a solução mais justa, mas perpetuaria a guerra por quanto tempo? Estamos preparados para isso? O poderio militar da Rússia, embora mais frágil do que se imaginava, e o apoio ocidental à Ucrânia arrastariam o quadro actual muito para lá do que seria suportável pela comunidade internacional. 

Se fosse possível voltar atrás, a 2013, e realizar referendos de autodeterminação nas regiões ucranianas do Donbas e na Crimeia, poder-se-ia avaliar a vontade das populações e negociar politicamente um acordo entre a Ucrânia e a Rússia, atendendo aos convénios anteriormente estabelecidos e às ligações seculares entre ambos os países. Hoje, isso não é possível, desde logo por causa da “russificação” levada a cabo nesses territórios através de migrações forçadas de milhões de russos.

Quando um dos contendores da guerra revela um comportamento imprevisível e violador de todos os princípios do direito internacional, como sucede com Putin, é difícil esperar que o país vítima de ataque e as próprias organizações internacionais, como a ONU, consigam olhar para ele como um parceiro fiável e de confiança. Como também não se vislumbra que surja na Rússia um movimento capaz de derrotar e derrubar Putin, vejo com muito cepticismo a possibilidade de se poder encontrar uma via para a paz a breve prazo.

O que sei é que a solução não passará com certeza pelo envolvimento directo das forças da NATO no terreno, como alguns preconizam, pois isso significaria uma escalada no conflito que poderia levar a um confronto de proporções inauditas.

O tempo acabará, fatalmente, por gerar um ponto final para esta guerra hedionda. Infelizmente, já com um custo elevadíssimo de vítimas e cidades destruídas. Acredito que as consequências materiais do esforço de guerra vão inevitavelmente debilitar a Rússia, fragilizando a sua posição negocial, mas para isso convém que os países europeus se deixem de tibiezas, reforcem as sanções e diminuam o mais rápido possível a sua dependência energética face àquele país, deixando de alimentar os cofres da Rússia em pleno período de guerra. O acordo alcançado no Conselho Europeu desta semana foi mais um passo positivo nesse sentido.

josé carlos pereira scaled e1654007427961

José Carlos Pereira

Gestor e Consultor