A liberdade. Eis algo que buscamos desde sempre sem sabermos exatamente do que se trata. No fim de contas, não existem nenhuns parâmetros que definam rigorosamente a liberdade, não existe nenhuma equação vetorial ou fórmula química que nos permita alcançar um estado de pura liberdade, desde logo porque não sabemos o que isso é.
Com isto, reflita-se sobre a nossa situação atual: a pandemia.
De facto, ouvimos que estamos "restritos na nossa liberdade", mas, em termos práticos, como podemos entender isso? Dizer que estamos restritos implica entendermos que antes éramos livres (pelo menos parcialmente), mas a verdade é que, apesar de provavelmente o sermos, não o éramos. Decerto que isto soa estranho, mas entenda-se o seguinte: quanto mais livres somos, mais ameaçados nos sentimos, mas, quando nos restringem essa liberdade, também nos sentimos ameaçados. É o paradoxo da liberdade.
Afonso Cruz, no seu livro "Nem todas as baleias voam", escreveu o seguinte: "Não abras as gaiolas aos pássaros, senão morrem de liberdade". Talvez esta frase nos ajude a resumir esse paradoxo.
As aves numa gaiola, como qualquer ser vivo que se encontre em cativeiro, se forem colocadas em liberdade, morrem, simplesmente porque não sabem viver de outra maneira que não seja presas. Da mesma forma, um homem que esteja habituado a uma restrição sente-se intimidado ao ver-se sem ela, ao ver-se, em termos literais, mais livre. São provas disso aqueles que desde que nasceram viveram sobre um regime de ditadura e agora, face à onda de "liberdade" em que mergulham, retaliam com frases como "Quem me dera o tempo de Salazar" (ou qualquer outro ditador).
Se tentarmos entender a origem profunda desta frase, vemos que o que a despoletou não foi o facto de ver que atualmente os jovens reclamam de coisas fúteis ou que não entendem a maior liberdade que têm, mas sim o facto de que a essas pessoas lhes foi retirado algo quase intrínseco e do qual agora sentem falta; sentem falta da falta de liberdade.
Adaptando isto à "nossa" pandemia, existe quem se sinta preso em casa (porque de certa forma até o estamos), mas na verdade, quando tudo isto passar, quando formos livres das nossas "prisões domiciliárias", iremos continuar a queixar-nos da nossa "falta de liberdade", seja por termos de ir para o emprego, seja pela prisão que é pagar contas, o que quer que seja, porque, no fundo, a liberdade total é algo inatingível.
Artigo de opinião de Duarte Miguel Ribeiro Lopes