Há 12 anos Jorge Brandão escolheu ser enfermeiro e, hoje, "voltaria a fazer a mesma escolha", mesmo sabendo dos momentos que a profissão lhe pode 'roubar', como o Natal em família.
É "sempre difícil" passar datas mais especiais longe daqueles que nos são mais queridos e que o enfermeiro vive essa realidade na Unidade Local de Saúde do Tâmega e Sousa, onde trabalha há seis anos. Este será o segundo Natal que passa a trabalhar e o "mais difícil", porque em casa irá ficar a filha de apenas 21 meses. "Há uma carga emocional muito forte. Já passei alguns Natais fora de casa, mas quando temos uma família, filhos, as coisas complicam um bocadinho a nível emocional. Não estarmos na hora da refeição, no momento de abrir as prendas ... é triste".
A primeira noite de Natal na ULSTS foi "difícil", com a chegada de um doente "complicado na hora crítica". Não deu fazer a "tal chamada" e Jorge não esquece "esse dia", tal como todas as restantes datas que passa longe dos seus e que obrigam a uma "mudança da dinâmica. Este ano vamos esconder as prendas e vamos abrir na manhã do dia 25. A magia de Natal só acontece quando eu chegar a casa".

Para o enfermeiro continua a ser complicado passar as datas festivas a trabalhar, mas "alguém tem de o fazer. As fatalidades acontecem todos os dias e às vezes mais do que aquilo que as pessoas pensam, porque é um dia que há muita alegria, muita euforia e as pessoas não tomam as medicações, exageram ... e estão muito suscetíveis às coisas acontecerem. E quando acontecem tem de estar cá alguém. E esse alguém somos nós".
No entanto, Jorge encontra o "sustento das equipas que trabalham sobre esforço e pressão" no "companheirismo. Se correu mal a um, correu mal a toda a gente. Se correu bem a um, correu bem a toda a gente. Há um esforço coletivo que não precisa de ser verbalizado ou combinado. Através dos olhares conseguimos construir esta relação e fazer com que as coisas corram bem para toda a gente", garante.
Médicos, enfermeiros, técnicos e todos os profissionais que trabalham no hospital são, nestas e noutras noites, "a família que os doentes não têm" e que dá resposta aos idosos que "recorrem ao serviço nestas noites como um abrigo. Nós cá estamos para transmitirmos, também, um bocadinho esse calor humano que falta nas casas dessas famílias. Nós somos a família de quem vem até cá e quem vem até cá é a nossa família".
No caminho para o trabalho a "nostalgia" vem ao de cima, mas assim que entra no hospital Jorge percebe que estão "todos no mesmo 'barco'".
"Não me imaginava a trabalhar noutra coisa"
Otília Nascimento é técnica auxiliar de saúde e há cinco anos que sabe o que é estar longe da família na véspera de Natal. "Já passei aqui Natal, Passagem de Ano, Páscoa ... tudo o que é festas. Às vezes abdicamos do tempo em família, em prol do trabalho para poder ajudar outras pessoas".
Antes de trabalhar no hospital "era habitual passar a data sempre com a família", mas com a mudança profissional teve de se "habituar à ideia" e nas "horas mais apertadinhas" faz videochamadas com quem fica em casa a cumprir a tradição. "Não é a mesma coisa. Deixar a prendinha e depois não ver a reação da pessoa quando está a abrir, mas foi isto que escolhi", diz com o orgulho de quem não se arrepende de "passar a quadra a cuidar de quem precisa".

O primeiro Natal passado longe da família ainda está bem presente na memória e "foi muito estranho. Estive no convívio com os colegas, mas logo consegui saí e fiz uma chamadinha para confortar um bocadinho os meus", recorda.
Hoje, as "netinhas reclamam" com a avó que "só trabalha. Eu digo-lhes que preciso de ganhar dinheiro. Mas um dia vão perceber", diz Otília, que se sente "feliz" e gosta "muito" do que faz. "Não me imaginava a trabalhar noutra coisa".