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Seguiu as pisadas do pai mas não por obrigação. Foi mesmo a paixão que o fez entrar e manter-se durante 43 anos nos Bombeiros Voluntários de Paredes. É um dos mais antigos da ‘casa’ e há 24 anos tomou posse como segundo comandante da corporação.

Aos 61 anos, José Garcez recorda a entrada nos Bombeiros Voluntários de Paredes e desfia momentos dos 43 anos de serviço voluntário.

Há quanto tempo é que os bombeiros fazem parte da sua vida?

Desde miúdo, porque entrei para o corpo dos bombeiros com 16 anos. Sou o mais velho de 12 irmãos e cinco deles rapazes que também ingressaram na carreira de bombeiros. Já o meu falecido pai era bombeiro. Foi uma paixão de família e nunca uma obrigação. Ando por cá há 43 anos, já é um bocadinho, é uma vida.

Tinha noção da responsabilidade que era ser bombeiro?

Naquela altura, em 1981, não tinha muito a noção dos riscos que se corriam. Eu acompanhava o meu pai, ainda nas instalações antigas, mas não tinha a noção que tenho hoje.

Sempre foi voluntário?

Sim, até porque tinha o meu trabalho. Comecei na câmara, com 17 anos, e quando da reorganização das freguesias passei para a EDP. Mesmo em regime de voluntariado, quis continuar tanto tempo, porque é mesmo paixão.

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A 12 de dezembro de 2000 tomou posso como segundo comandante. Foi uma responsabilidade que aceitou de imediato?

Lembro-me do dia em que recebi o convite, foi o comandante José Morais. Já cá andava há alguns anos e pedi-lhe para pensar durante cerca de um mês e para poder falar com a família. Era casado e já tinha filhos. Ser um elemento de comando implica ter mais responsabilidades, temos de deixar muitas coisas para trás, como a família, e se não houver uma retaguarda é difícil. 

Sendo voluntários há tantos anos, não se arrepende de ter dedicado a vida aos bombeiros e ter deixado para trás tudo isso? 

Não, de todo. Ainda hoje continuo com o mesmo entusiasmo com que iniciei. Estou cá todos os dias e, sempre que é preciso, estou disponível para o que for necessário. A minha mulher até diz que é a minha primeira casa. Gosto muito de ajudar os outros, estar presente na ajuda, é mais uma paixão do que outra coisa. 

É mais uma paixão do que outra coisa

O que move um bombeiro, é o querer ajudar? 

Claro que sim. O querer ajudar o próximo e estar sempre disponível para as pessoas quando precisam. Eu sei que hoje é totalmente diferente, a realidade é outra, não tem nada a ver com aquela quando entrei. Antigamente, não havia profissional nenhum, hoje já há alguns e as pessoas exigem mais dos bombeiros. O socorro já não se compadece com voluntariado. Continuo a perceber que há muito respeito e carinho pelos bombeiros, mas hoje há muitas entidades para além dos bombeiros.

Em 43 anos de bombeiros, há alguma história que o tenha marcado mais?

Tenho um momento que recordo e, ainda hoje, penso muitas vezes nele. Fomos acionados para um incêndio e na chegada ao local vi dois miúdos pequenos que morreram queimados. Foi há muitos anos, penso que ainda estávamos nas antigas instalações. Quando lá chegamos, infelizmente, já se encontravam sem vida. Ajudei a tirar e lembro-me, porque tinha dois filhos pequenos. Lembro-me sempre daquela imagem. Foi um incêndio que mais me marcou, além de outros em que ajudei. De muitas histórias, essa é a que me lembro muitas vezes.

Vêm um pouco de tudo e têm de estar preparados para isso?

Deparamo-nos com muitas situações diferentes, como pessoas que se suicidam, que se atiram para a linha do comboio, já várias vezes fui buscar alguns. Acabamos por não nos conseguirmos desligar totalmente. Temos um momento de reflexão, não desligamos logo na hora. Na ação temos de ter sangue frio para atuarmos e incentivar os mais novos para que as coisas corram bem. Andamos um dia ou dois a pensar no que aconteceu, mas a nossa vida é mesmo esta.

Mas há, também, histórias positivas para recordar?

Sim, também temos bons momentos. Temos os nossos aniversários, que são dias marcantes, como os 140 anos que vamos comemorar. Temos algumas atividades que não orgulho. E, damo-nos todos bem, temos de estar unidos. Eu trabalho na base da lealdade para que as coisas se prolonguem na vida. 

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Ao longo destes 43 anos acompanhou muitas mudanças nos Bombeiros Voluntários de Paredes?

Vi toda a juventude a entrar. Da minha escola só somos dois e sinto que somos uma inspiração e exemplo para os mais novos. Fazemos por isso e procuramos passar-lhes o espírito de voluntariado e damos-lhes ânimo, porque por vezes desanimam, querem sair, e nós vamos dando alguma ajuda para que eles não desistam e continuem em frente.

Pela sua experiência, sente que tem havido pouca procura, dos mais jovens, em querer se bombeiro?

Nós temos uma escola de infantes e diria que 95% dos miúdos seguem a carreira. Estão dos cinco aos 17 anos, depois fazem a escola, que é o viveiro para que continue a haver voluntários. Já fizemos vários apelos, mas é muito difícil e eu compreendo. Na minha altura quando abria uma escola entravam 20 ou 30 voluntários, hoje não, porque os jovens têm muitas outras ocupações. 

Depois de tantos anos ainda tem vontade de continuar nos bombeiros?

Há um limite. Aos 65 anos, por força da lei, tenho de passar ao quadro de honra e sair da parte ativa. Mas vou continuar a estar todos os dias no quartel, até porque moro mesmo ao lado. Passo aqui todos os dias e espero vir cá cumprimentar os colegas. Vou sair dos bombeiros, mas quero sair como entrei.

Para terminar, quer deixar uma mensagem pelos 140 anos da corporação?

É uma instituição muito velhinha, que se vai adaptando às novas tecnologias e à realidade. Faço um apelo à juventude, que venham para os bombeiros, que se inscrevam, porque dar um pouco de nós aos outros é muito compensador. Da experiência que tenho, ao longo destes 43 anos, não me arrependo e, se hoje tivesse 16 anos, faria a mesma escolha que fiz na altura.