Na casa dos 103 anos "e meio", Maria da Luz, uma mulher natural da freguesia de Alpendorada, Várzea e Torrão, no concelho do Marco de Canaveses, levanta-se, senta-se e caminha sem ajuda e, ainda, dá umas gargalhadas.
Na casa em que recebeu o Jornal A VERDADE, Maria da Luz vive há mais ou menos 40 anos. Antes disso viveu ao lado do Convento, aquele que é o espaço preferido da centenária. "Então não hei de gostar de Alpendorada, gosto muito do convento e da igreja". É desta forma que descreve a sua terra natal e os espaços que frequentou. Maria da Luz dedicou a vida à igreja, agricultura e família. "A fé mantém a vida, ajuda a ter força para continuar a viver, mas é claro que ajuda". Já na agricultura não teve muita opção. "É desde que me lembro… tinha cinco anos e já ia para o campo. A minha escola foi a enxada, mas também tinha o meu livrinho à noite. Foi o meu pai que me deu". Embora possa parecer limitador, foi o suficiente para aprender a ler e a escrever. "Gosto de ler e deu para escrever muitas cartas".

Maria da Luz viveu um casamento "feliz" e dedicou-se aos oito filhos. "Casei-me com um marido e chegou. Eu tinha 25 anos e ele 26. Vivemos um casamento feliz durante várias décadas". Entre o campo, as lides domésticas e as panelas e tachos de comida, a mulher de 103 anos procurou ser uma "boa mãe. Sempre gostei de cuidar dos meus filhos, cresceram todos e foram à vida deles e Graças a Deus desenrascam-se todos. É uma alegria vê-los bem. Estou satisfeita, para além dos filhos, ainda tive a meu cargo mais dois e depois mais um". Mário Luís é um deles e conta, em conversa com o Jornal A VERDADE, que "os pais estavam emigrados na Venezuela" e, por isso, a tia, Maria da Luz, foi "uma segunda mãe". Assim, foi com "amor e carinho" que Maria da Luz cuidou da família e é com o mesmo sentimento que a continua a receber.
103 anos permitiram a Maria da Luz conhecer 23 netos, mais de 30 bisnetos e, ainda, uma trineta. Estas são as pessoas que "mais ama. Gosto de ter as pessoas comigo, sou uma mulher de família".

Embora seja praticamente impossível reunir toda a família, Maria da Luz recebeu uma surpresa no centésimo aniversário e a 15 dias do confinamento. "Estiveram mais de 100 pessoas. Vieram de Lisboa, Suíça e Espanha... de vários cantinhos. Vi família que já não via há muitos anos. Foi um momento de muita alegria".
Na sua opinião, para a longevidade "não há segredos" e "qualquer um pode lá chegar". Maria da Luz passou os dias em contacto com a natureza e agricultura e sempre a tentar manter a calma. "Não há segredo, toda a gente pode lá chegar. Tem que se ter paciência e logo que me deixem estar calma...", afirma, entre risos.
"Espreito à porta e à janela para ver como está o tempo. Ainda há dois anos trabalhava no campo, agora já não consigo tão bem, mas se tiver bom tempo ainda vou até lá e pego no meu sacho e faço alguma coisa", conta. Já as vozes da televisão não deixam Maria da Luz tão feliz. "Música e televisão não gosto tanto, só se for alguma coisa religiosa".

"Enquanto Deus quiser" Maria da Luz continuará a pisar a terra que a viu nascer e crescer. "Sou uma mulher feliz e realizada com o meu percurso de vida e o conselho que posso deixar às outras gerações é para que sejam boas pessoas, não enganem, nem mintam".
A longevidade parece uma característica desta família. Maria da Luz é a irmã mais velha, mas ainda vive na companhia de mais quatro irmãos, três deles com mais de 90 anos.
Com o Natal a aproximar-se, a família partilha que não cria planos. "Não se planeia a festa, é mais em cima da hora", afirma Mário Luís e a tia acrescenta: "tenho uma carta de chamada e ela pode chegar e depois ficar embargada a festa" e volta a sorrir. O mesmo acontece com o seu aniversário, se "Deus quiser" irá festejar, no dia 5 de março de 2024, 104 anos de vida. "Estou muito bem de saúde, acho que nem merecia tanto".
