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Da área da saúde às tortas de São Martinho, 'Zézinha' faz tudo com "amor e carinho"

Redação

Trabalhou na área da saúde durante 19 anos, mas o "ambiente ficou mau" e Maria José Melo decidiu despedir-se. Aí começou a "longa história" das tortas de São Martinho, uma iguaria tradicional de Penafiel mais apreciada nesta época.

Depois de abandonar o trabalho que tinha, 'Zezinha' - como também é conhecida - teve uma padaria e, entretanto, "surgiu a oportunidade de tomar conta de um café", onde já se vendiam as tão conhecidas tortas. O segredo não lhe foi passado, o que não esmoreceu a vontade de dar continuidade à tradição. "Eu não gostava muito de fazer só a pastelaria tradicional e, nessa altura (corria o ano de 2004) a tradição das tortas de São Martinho estava a perder-se. Só havia um café - o Alvorada - que as confeccionava", recorda.

Então, a penafidelense de 56 anos decidiu preservar e reviver a tradição. A confeção das tortas deram-lhe alguma notoriedade no concelho, motivo para ser convidada, em 2005, pela autarquia a participar na tradicional Feira de São Martinho. "Ainda tinha o café na altura. Mas aceitei e, a partir daí fui sempre. Hoje, já sou muito conhecida por todos, porque faço esta feira há muitos anos".

Qual o segredo de uma boa torta?

Já são "muitos anos" a fazer tortas que "dão saúde", porque nelas Zezinha coloca o gosto pela profissão. "Gosto tanto do que faço e acabo por transmitir isso para o produto", garante a doceira, que à tradição decidiu mas adicionar uma pitada de inovação, porque como nos diz gosta de "marcar a diferença. Interessei-me pela receita, comecei a procurar a receita junto de pessoas mais velhas e, ao longo dos anos fui aperfeiçoando".

Assim, para além da torta de São Martinho - confecionada com carne - surgem as tortas doces e para diferentes gostos. "Percebi que as pessoas queriam um docinho na feira e não havia. Então lembrei-me de criar as doces. Digamos que é um folhado doce", explica.

As ideias "vão surgindo" e Maria José Melo gosta de "ir experimentando", porque se considera "criativa" e gosta de "servir o melhor. Por um lado gosto de fazer coisas diferentes, mas por outro gosto de manter as tradições e isso está refletido nas próprias receitas. Por exemplo, eu não gosto de comprar as coisas feitas, gosto de ser eu a fazer. Só não faço o doce de chila e o chocolate que ainda não sei fazer. Quanto menos químicos tiver melhor. Dá muito mais trabalho, mas foi uma opção minha fazer tudo tradicional. É preciso ter gosto por aquilo que se faz, senão não se conseguia", garante.

A Feira de São Martinho começou no dia 8 de novembro e se já por lá passou ficou a saber que há mais uma torta a provar. Figo e noz é o mais recente recheio. "Criei o figo caramelizado, meti a noz e provei. Gostei e decidi avançar com a ideia. É muito difícil vender algo que não gosto. Não consigo. Mas esta vai acabar cedo, só até amanhã ou depois, porque os figos são da minha figueira".

Coloco muito amor e carinho naquilo que faço

Em pouco mais de três dias, foram já "muitas" as tortas vendidas e sem "conseguir avançar com números", a penafidelense não tem dúvidas de que vendeu "mesmo muitas" e a cada ano vende "cada vez mais".

O segredo? Está nas mãos de quem prepara nos ingredientes e entre os principais estão "o amor e carinho. Eu costumo dizer, eu ponho muito amor e carinho naquilo que faço, em tudo. Para além disso, uma boa torta de São Martinho tem a ver, sobretudo, com a qualidade da carne e um bom folhado. O trabalhar a carne é relativo, porque cada um tem o seu paladar, mas a qualidade da carne e a frescura são muito importante. E o amor e carinho como já disse, mas isso em ponho em tudo".

"Tenho clientes fidelizados. Para mim, é uma satisfação"

Para além da irmã que usa como "cobaia" para provar as novidades, Zezinha divide a "paixão" com os dois filhos e o marido. "É uma empresa familiar e as primeiras opiniões são sempre deles".

Na conversa, fica evidente o "orgulho" que sente por manter a tradição do concelho, mas sabe que o futuro será "mais incerto. Isto tem crescido mesmo muito, mas acho que quando eu faltar ou quando não conseguir não vou ter quem siga a tradição. Embora o meu filho (o braço direito) seja bom comercialmente, na concepção é um pouco mais complicado. Já são modernos, não são muito de manter as tradições. Acredito que vai ser diferente. Mas enquanto eu puder, cá estou. Quando eu não puder depois vesse"

Para já, são "muitos" os clientes que tem para servir e diz "vender muito bem" aos clientes "fidelizados. São vários e, para mim, é uma satisfação. O meu filho, agora com 22 anos, está a servir ao balcão e há clientes que me dizem 'lembro-me do seu filho pequenino a andar atrás de si'. É muito gratificante ter clientes que continuam a querer comprar as minhas tortas passados tantos anos".

Durante o ano, esses mesmo clientes "vão a outros lados comprar", mas chega o São Martinho e dizem "já tinha uma saudade das suas tortas. Noto, em cada feira que faço, que as pessoas procuram e têm saudades do meu produto. Disso não tenho dúvidas".

Porque se associam as tortas a São Martinho a Penafiel?

A história das tortas de São Martinho remonta a uma tasca em Penafiel ("Tasca do Coelho"), onde uma senhora pediu emprego e propôs fazer uns pastéis de carne picada para os clientes. "Era a chamada, na época, torta de Basto, uma vez que a senhora vinha de Celorico de Basto. Segundo consta, o senhor precisava de uma funcionária e deu-lhe trabalho. Ela sugeriu fazer os pastéis, que fizeram sucesso e se tornaram uma tradição na região", explica Maria José Melo.

A torta de São Martinho poderá, "também, estar associada à matança do porco, porque é um bolo que satisfaz. Antigamente, fazia-se com massa tenra, semelhante à de um rissol. Eu também tenho essa receita, mas faço de uma forma completamente diferente. É um picado bastante mais forte, mais agressivo e é uma massa que fica dura. As pessoas não apreciam tanto e eu só faço por encomenda e não é para qualquer pessoa".

Neste momento, Zezinha considera-se uma "sortuda" por fazer o que gosta, seja por encomenda ou nas feiras em que participa (Feira de São Martinho, Flores e Sabores e Mercadinho de Natal).