Há 30 anos que a Cruz Vermelha de Frazão, do concelho de Paços de Ferreira, se compromete a servir a população e a prestar "o melhor socorro possível". Em entrevista ao Jornal A VERDADE, o presidente da instituição, Joaquim Sérgio Gomes, aborda o crescimento "positivo" ao longo dos anos e revela os projetos que ambiciona concretizar antes de se despedir do cargo.
Qual o papel da Cruz Vermelha de Frazão?
Nós temos várias valências, mas claro que existem diferenças entre as várias delegações. No nosso caso, estamos a falar de uma instituição que nasceu num barraquinho de chapas, um espaço diminuto com o objetivo principal de socorrer doentes, principalmente, vítimas de acidentes ou pessoas que se sentissem mal em casa. A Cruz Vermelha de Frazão foi expandindo para várias áreas e uma em que foi crescendo muito foi o transporte de doentes não urgentes. Hoje, a nossa principal missão é o socorro e transporte de doentes urgentes, mas a nossa maior atividade é o socorro de doentes não urgentes. Neste momento, temos 10 viaturas, todos os dias, a fazer esse transporte (são mais de 600 quilómetros por dia, de transporte de doentes para consultas, fisioterapias ou hemodiálises). Temos, também, a vertente da ação social. Aliás, somos o único polo no concelho que faz o apoio mensal a cerca de 600 pessoas (entregamos um cabaz mensal, através de um programa comunitário).
Qual o vosso território de atuação?
Enquanto que os Bombeiros Voluntários de Paços de Ferreira e Freamunde dividem o território, a Cruz Vermelha de Frazão não entra nessa divisão territorial. Atuamos em todo o concelho e, atualmente, 30% das nossas emergências são para a zona de Santo Tirso. As ativações são, normalmente através do Centros de Orientação de Doentes Urgentes (CODU), cada vez mais as pessoas ligam 112 e sentimos que as pessoas da nossa zona ligam diretamente para nós em vez de ligarem para os bombeiros. Não temos a parte dos incêndios e a parte de desencarceramento, mas em termos de resposta é igual. Estamos disponíveis 24 horas por dia, 365 dias por ano.

Quantos funcionários constituem a delegação?
Na vertente profissional são, no total 12 funcionários e voluntários somos cerca de 60. Houve um período em que os voluntários diminuíram, entre 2014 e 2017. Ultimamente, temos crescido, embora quiséssemos crescer mais. Mas nota-se que há menos pessoas do que havia num passado longínquo, porque agora há uma dificuldade de recrutamento de novos voluntários.
E por que razão existe essa dificuldade? Tem a ver com uma possível falta de apoios?
Eu acho que não, porque as pessoas quando vêm não é por esse motivo, vêm voluntariamente. Claro que os incentivos ajudam sempre, mas acho que tem a ver com a forma estrutural da sociedade. Cada vez mais as pessoas não assumem o compromisso. Por exemplo, organizamos o trail e precisamos de muita gente para nos ajudar e, de facto, tivemos essa ajuda, mas foi para aquele momento e para aquele dia. Para ser o compromisso o ano inteiro, fazer uma escala de serviço todas as semanas e cumprir uma noite, fazer um fim de semana, não é tão fácil arranjar como antigamente. A sociedade mudou muito, hoje as pessoas não têm um emprego para a vida. Há uns anos casavam aos 20 e pouco, estabilizavam profissionalmente e nunca mais saíam dali. Hoje, quase todas as pessoas têm uma licenciatura e, por isso, tanto estão a trabalhar em Frazão, como daqui a um ano estão em Lisboa. Há muito mais mobilidade e as pessoas não se fixam e há uma maior instabilidade a vários níveis. Mas não nos podemos queixar, porque crescemos em termos de voluntariado.
São 30 anos de um crescimento positivo?
Sim, sem dúvida, muito grande. Em termos de pessoas, numa fase inicial, havia muito mais gente, mas também era uma experiencia nova, os jovens não tinham tantas ocupações. hoje, é diferente, mas de qualquer forma crescemos muito. Houve um declínio em todas as instituições, como já referi, mas nós temos agora um crescimento de voluntários e estamos a crescer em termos de instalações e de serviços.

Há quanto tempo é presidente da Cruz Vermelha de Frazão?
Desde 2017, embora esteja cá desde 2007. As instalações ficam muito perto de minha casa e quando nasceram eu era jovem. Estiveram irmãos meus, um deles foi comandante (na altura ainda havia comando). Eu iniciei na área da ação social, sou licenciado em serviço social e, com o tempo, fiquei na direção e, entretanto, assumi a presidência.
Porque assumiu? É bom servir a população?
A Cruz Vermelha de Frazão passou por dificuldades financeiras muito graves. Tínhamos dívidas muito grandes e eu achava que tínhamos capacidade para dar a volta a situação. Então pensei 'não posso abandonar sem que no mínimo tenhamos pago todas as dividas. Depois de estar tudo pago posso sair'. Fui ficando e agora tenho um objetivo que prefiro não revelar, mas não é pessoal. Quando estiver concretizado posso sair. Já fiz a minha parte, mas ainda quero fazer mais alguma coisa. É verdade que nunca vai estar tudo feito, mas há uma coisa que queria fazer e a partir do momento que esteja a funcionar dou a vez a outros.
Quanto ao futuro, existem mais projetos a concretizar?
Sim, queremos crescer numa outra área que já temos - a Casa Amiga, uma resposta social para pessoas que ficam desalojadas. Temos uma resposta até se conseguir encaminhar para os serviços competentes, que é cada vez mais difícil. Queremos transformar esse espaço e temos uma candidatura aprovada ao IHRU - Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana irhu, para a construção de um alojamento urgente temporário para 13 pessoas.
Quer deixar uma mensagem à população e aos colegas?
Não sou socorrista, mas no Natal e no Ano Novo estou sempre ao lado deles na Cruz Vermelha de Frazão. Aliás vou lá todos os dias, porque acho que se os outros são voluntários, eu tenho de ser muito mais. Por isso, deixo uma mensagem de esperança. Houve um período em que as pessoas não acreditavam tanto na Cruz Vermelha, mas temos reforçado e melhorado a imagem, quer com a presença dos nossos socorristas quando as pessoas solicitam, e fazem um trabalho espetacular, quer depois com as atividades que também temos, que reforçam a imagem da cruz vermelha. Acima de tudo, espero que que a população tenha um bom ano.