catarina silva medica
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Atualmente, Catarina Silva é médica no Hospital de Santo António e está a tirar a especialidade de Endocrinologia e Nutrição. Mas se recuasse uns anos antes, não diria que seria este o futuro profissional. “Contrariamente a muitos colegas meus, não quis sempre ser médica, nem tenho nenhum familiar que me pudesse incentivar nesse sentido. No final do 3.º ciclo, quando escolhi a área das Ciências e Tecnologias já tinha algum interesse na medicina. Contudo, no ensino secundário, fiquei encantada pela matemática. No final do 12.ºano, tinha ‘em cima da mesa’ este curso e o de gestão”, recorda.

Assim foi, decidiu optar pela medicina “pela vertente humana da profissão”, porque achava que se ia “sentir mais realizada a trabalhar com pessoas do que com números”.

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A exigência do curso de medicina, “quer do ponto de vista académico, quer do ponto de vista de gestão emocional e de tempo de lazer/descanso é muita” e, em certos momentos, confessa que duvidou “se estaria no caminho certo porque no início é tudo tão teórico, o que acaba por ser desmotivante. No 3.º ano, aquando do contacto com a parte clínica, fiquei mais motivada a seguir este caminho profissional”, explica a jovem de 25 anos.

Apesar dos desafios e dificuldades encontradas, hoje não tem dúvidas do que mais a fascina nesta profissão. “A ‘magia’ da medicina é, e sempre serão, as pessoas. É gratificante ver o quanto a nossa intervenção contribui para fomentar a qualidade e a dignidade da vida humana e para a manutenção de uma sociedade mais próspera e saudável. É uma profissão muito bonita porque ser médica é ser cientista no exercício da medicina, é ser uma eterna estudante, imbuída na compaixão e competência para ajudar o próximo”.

Mas como em todas as áreas da vida, existe sempre um reverso da moeda. No caso da medicina, trata-se de um trabalho “árduo. O que se passa no Sistema Nacional de Saúde é desencorajador, é ilegal, é silenciado. Entristece-me o desrespeito pelo meu trabalho, os atropelos laborais a que sou sujeita: desde o número de horas extraordinárias que não são remuneradas, o incumprimento pelos descansos compensatórios, a falta de recursos materiais (como computadores, impressoras, ou simples papel para imprimir a receita para os doentes…), a falta de recursos humanos… “.

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O trabalho em regime de urgência “é, por vezes, um verdadeiro cenário bélico”, garante Catarina Silva. “Não há tempo de descanso, cada vez se clica em ‘atualizar’ a lista de doentes aumenta. Não raras as vezes, não há a medicação que prescrevemos para dar aos doentes, não há sítio onde colocar os doentes, não há a privacidade para realizar um exame médico. Por vezes, é no corredor ou num gabinete onde estão outros doentes”, diz descontente.

Na azáfama de um serviço de urgência “A probabilidade de erro aumenta, trabalhando em condições subótimas, para não dizer desumanas. Nada vejo a ser feito por parte dos nossos decisores políticos para isto que se altere. Juntando a isto ao facto de vivermos numa sociedade cada vez mais litigante, preocupa-me o futuro enquanto médica”.

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Atualmente, são ouvidos relatos de descontentamento de outros profissionais da área, mas esta jovem procura desempenhar a profissão “com espírito reformista, preservando a qualidade da medicina contra qualquer tipo de pressão ou condicionante. Tudo aquilo que puder fazer para defender os doentes e o direito a melhor cuidados de saúde, fá-lo-ei. É no sistema de saúde público que todos começamos e onde saímos melhor médicos, todos os dias temos casos diferentes, que nos incutem a estudar, a partilhar opinião com outros colegas…  Olho para o futuro com esperança de que os princípios éticos e deontológicos que servem de base a ser médico sejam mais respeitados“, garante.

O curso de medicina é exigente e faz-se um longo caminho para o concluir e os conselhos de quem por lá passou são cautelosos: “Sejam metódicos e responsáveis. Tirem tempo de estudo que seja proveitoso (afastando possíveis distrações), priorizem o que realmente é importante ou é mais urgente estudar para aquela semana, façam a planificação do estudo de forma a incluir tempo de descanso/lazer. Envolvam-se noutras atividades para além da medicina, porque isso acaba por nos enriquecer”.