Em 2024, a Associação Quebrar o Silêncio recebeu mais 160 novos pedidos de apoio. Dos novos pedidos, 112 foram provenientes das vítimas e outros 50 da parte de familiares e amigos.
As vítimas têm, em média, 31 anos e mais de 90% relata que conhece o agressor, que é quase sempre um homem. “Não é um estranho com ar suspeito que está numa esquina à espera da vítima. São as pessoas da própria família, são os amigos, são colegas, são pessoas próximas da vítima e isto é fundamental as pessoas reconhecerem”, disse à Lusa Ângelo Fernandes, diretor-executivo da associação.
Os pedidos de apoio, “a esmagadora maioria”, chegam por e-mail, “porque se sentem mais seguros do que ligar. E temos homens que nos dizem que demoram seis meses a escrever o e-mail, ou seja, guardam-no nos rascunhos ou apagam, voltam a escrever”.
Segundo o responsável, a associação registou, em 2024, uma diminuição média de idade de quem pede ajuda. Nos primeiros sete anos, os homens que recorreram à Quebrar o Silêncio tinham entre 37 e 38 anos, uma média que baixou no ano passado.
Com o aumento dos pedidos de ajuda, os crimes associados têm sido “cada vez mais diferentes”. Para além disso, nos primeiros anos, a maioria dos crimes tinham ocorrido durante a infância e, agora, existem cada vez mais casos relatados na idade adulta. Entre os crimes estão casos de perseguição, assédio sexual no trabalho, violência em contexto de intimidade ou namoro, e também assédio em contexto de atividades desportivas ou no decorrer de cuidados médicos.
Em 2024, os casos acompanhados diziam respeito a crimes de abuso sexual de crianças (59,1%); coação sexual (10,9%); violação (10%); perseguição, importunação sexual e assédio sexual no local de trabalho (7,3%); atos sexuais com adolescentes (5,5%); violência sexual em contexto de violência doméstica (4,5%); violação (forma tentada – 2,7%).
A violência sexual continua a ser um tabu
De acordo com Ângelo Fernandes a violência sexual continua a ser um tema tabu e sobre o qual há pouco conhecimento.
As estatísticas da associação indicam que os homens adultos são os que menos procuram ajuda, representando cerca de 20% do total de pedidos de ajuda, um número que terá como explicação a ideia que “homens adultos não podem mesmo ser vítimas de abuso sexual. Também temos homens que não sabem que podem ser abusados na intimidade, pelo parceiro ou pela parceira”, acrescenta.
O trabalho futuro da associação Quebrar o Silêncio irá passar pela formação e sensibilização para o tema, tanto nas áreas da saúde ou psicologia, como entre os vários órgãos de polícia criminal, estando prevista uma nova formação no decorrer deste ano.
Ângelo Fernandes defende que continua a ser preciso desmistificar preconceitos, que levam a que as vítimas escolham ficar em silêncio, pelo “medo de serem mal recebidos, com juízos de valor” quando denunciam ou procuram ajuda e não terem segurança para poder trabalhar estas questões”.
Nos últimos oito anos, a associação Quebrar o Silêncio recebeu 830 pedidos de ajuda de homens e rapazes vitimas de violência sexual. Muitas das vítimas demoram anos até conseguir falar e, por isso, a associação pede o aumento dos prazos de denúncia para que os casos não prescrevam.