proclamacao republica portuguesa
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Artigo de opinião de Alberto Guimarães, historiador de arte.

5 de outubro de 1910 foi uma data de viragem na vida dos portugueses, um marco histórico que, sem dúvida, influencia a nossa vida de cidadãs e cidadãos já do século XXI. Com efeito, a implantação da República é proclamada numa manhã outonal de 1910, na varanda dos Paços do Concelho de Lisboa. As ideias da Revolução Francesa e do positivismo francês tinham chegado a Portugal e foram semente de um novo regime político.

Numa Europa de monarquias, a portuguesa era contestada, de tal modo que já em 31 de janeiro de 1891, as ruas do Porto foram cenário para uma revolta militar que as forças monárquicas reprimiram e neutralizaram. Mas o ideário republicano ajustava-se a todo um descontentamento, designadamente com as limitações à liberdade de imprensa e ao encerramento da sessão legislativa por decreto do governo de João Franco. Os políticos oriundos do Liberalismo tinham terreno fértil para conspirarem e lutarem por mudança. A burguesia liberal parecia estar munida de uma preparação, de uma disposição, capazes de constituírem uma boa alternativa para a solução dos muitos problemas nacionais. Apesar de algum progresso que o país vivia desde o século XIX, o estado de vida da maior parte dos portugueses era paupérrimo. Grande parte das pessoas concentravam-se e viviam no Porto e Lisboa, a vida nos campos era desoladora, os operários nas cidades manifestavam-se contra as suas péssimas condições de trabalho e baixas remunerações. A taxa de analfabetismo era avassaladora. Aos portugueses ficava aberta a porta da emigração em massa.

revoltosos nas barricadas rotunda 5 de outubro
Revoltosos nas barricadas da Rotunda. Autor: Joshua Benoliel

Progresso e modernização, conclamavam os liberais, os republicanos. Melhores condições de vida exigiam nas ruas os movimentos sociais.
A revolução republicana iniciou-se à 1 hora da madrugada de 4 de outubro com movimentações militares e assaltos a quarteis de Lisboa. Porém, os testemunhos, as descrições e as imagens de que dispomos (o cinema e a fotografia legaram-nos já a fixação das imagens desses momentos) focam o importantíssimo papel dos civis para o sucesso da revolta. Cabe aqui chamar a atenção dos leitores para o nome do fotógrafo Joshua Benoliel (1873-1932), que nos deixou épicas fotos dos acontecimentos ligado à implantação da república, das quais deixamos dois exemplos.

O jovem rei D. Manuel II partiu para o exílio, e inicia-se com o anúncio, nas janelas da Câmara Municipal de Lisboa em 5 de outubro de um governo provisório presidido por Teófilo Braga, um período de 16 anos conturbados em que se sucederam governos e presidentes da república, golpes, levantamentos e lutas intestinas no seio das hostes republicanas. Tudo num contexto que inclui a tormenta da I Guerra Mundial (1914-1918), da qual Portugal participou e a pandemia da Gripe Espanhola que muito nos assolou. Um conjunto de circunstâncias levaram a um processo inflacionário que o sistema não conseguiu controlar. Estava aberta a porta para o golpe militar de 28 de maio de 1926 que perverteu a constitucionalidade e permitiu a chegada de Salazar ao poder e a instituição da ditadura do Estado Novo.

Contudo, Portugal mudou entre 1910 e 1926. Refira-se que a I República instituiu a laicização da sociedade portuguesa (pesem os exageros e até a violência da perseguição à Igreja), criou os registos civis, permitiu o divórcio, valorizou a vida das mulheres, esforçou-se na educação.

O conhecimento da História permite que entendamos a nossa vida atual e nada pode ser impeditivo para que não conhecermos e entendermos o processo da implantação da república e as suas inerências. Existe hoje vasta literatura e documentários que, de modo acessível permitem que se compreendam esses 16 anos e o quão importantes foram.

A democracia que vivemos atualmente, a nossa avançada Constituição, são devedoras do processo revolucionário que levou à proclamação da República em 5 de outubro de 1910.