logo-a-verdade.svg
Notícias
Leitura: 0 min

Aos seis anos, o pequeno João Tomás trata o cancro por tu

Redação

"O seu filho tem Leucemia". Nenhuma mãe está preparada para receber esta notícia, mas foi exatamente este o diagnóstico que Joana Leitão recebeu dos médicos do filho João Tomás Couto, de apenas seis anos.

Os sinais de alerta "não foram muitos", mas agora, fazendo uma retrospetiva, admite que havia alguns indícios que foram "mascarados" por sintomas normais de uma virose, que afetou muitas crianças da região. "Tudo começou cinco dias depois da morte da minha avó. Passado uma semana, o João começou com terrores noturnos e a pediatra achou melhor encaminhar-nos para um psicólogo, porque podia estar relacionado com a perda da bisavó. A partir daí, começou a perder o apetite e a perder peso, andava mais apático, mais parado, fazia picos de febre na escola, mas chegava a casa e já estava bem. Sintomas estranhos que a pediatra dele desvalorizava porque havia muitas viroses naquela altura e estava sempre pronto para jogar à bola. Fez medicação, e ao fim de três semanas, melhorou. Não tivemos nenhum sinal de alerta claro devido a toda a envolvência", começou por explicar.

No entanto, apenas duas semanas depois, o pequeno João Tomás começou a queixar-se de uma dor na virilha do lado direito. A mãe Joana, cansada destes altos e baixos, decidiu levá-lo ao Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa, onde "foi diagnosticado com gases". Mas, por insistência, pediu para lhe fazerem umas análises, onde foi detetada uma "anemia grave", recorda. "Fomos encaminhados para o São João e começaram a fazer os exames. Os médicos que apanhamos foram maravilhosos e muito atensiosos", garante.

Como mãe, "sabia que algo não estava bem, não era o João Tomás do costume, mas tentava não pensar no pior". Contudo, o pior acabou mesmo por se concretizar, depois de um mês muito intenso. "Depois de umas análises, vi duas médicas a dirigirem-se na minha direção e percebi que algo estava mal. Chamei o meu marido e elas disseram-nos «O vosso filho tem Leucemia e vai ser encaminhado para o IPO». Naquele momento, caiu-nos tudo, não sabíamos o que fazer. Tudo o que planeámos, tudo o que sonhamos, desapareceu. Começou a gerar-se uma revolta muito grande. A partir daquele momento, a nossa vida mudou por completo. A notícia é avassaladora, destrói-nos, mas no fundo, não sabemos o que nos espera, olhamos para o futuro com medo e, nem mesmo agora, há certezas. Ainda é tudo muito recente, parece que já passaram anos, mas a verdade é que só passaram quase quatro meses, ainda temos um longo caminho pela frente. O João Tomás tem Leucemia Linfoblástica tipo B, é a mais comum nesta idade e com melhor prognóstico. Tem muitos fatores positivos a favor dele, mas o caminho é longo".

"As crianças são uma força da natureza, nasceram para viver e o que querem é viver, por isso sempre teve muita força"

O pequeno João Tomás "sabia que não estava bem" e, com o tempo, a mãe foi-lhe explicando "o que tinha, através de desenhos que ia fazendo. Neste momento já trata o cancro por tu. Não tem noção da gravidade da doença em si, mas sabe que é grave pelas alterações que teve na vida. As crianças são uma força da natureza, nasceram para viver e o que querem é viver, por isso sempre teve muita força. O pior é, sem dúvida, aquilo que deixou de fazer e que queria continuar a fazer, como o futebol e estar com os amigos".

A família começou "a viver num mundo à parte dos outros" e, para Joana Leitão, a palavra mais importante nos primeiros dias é "aceitar. Infelizmente ele teve de ficar em isolamento total, devido às defesas baixas, apenas os pais e os profissionais de saúde entravam no quarto, não recebia visitas e isso foi um choque muito grande. Mas com o tempo e a ajuda das enfermeiras e pediatras começamos a aceitar e a perceber que não temos culpa, que não é o único. Um dos momentos que me deu mais força foi logo no dia seguinte ao diagnóstico, ao sair do quarto do isolamento, ouvi na ala de não isolados uma criança a cantar e, ao olhar, vi um menino com cerca de dez anos que vinha pelo corredor a cantar alto e a dançar, aos saltos, com uma leveza tão grande que o menino nem imagina a força que me deu. Afinal era possível ser feliz no IPO".

Cancro não é palavra nova na vida de Joana

Apesar desta situação, Joana Leitão já conhece esta doença. Há sete anos, a mãe foi diagnosticada com cancro da mama, quando Joana estava grávida de João Tomás. Mas, de acordo com esta mãe, "são situações diferentes. Na clínica da mama, no IPO, só há adultos, sérios, calados, que carregam uma doença muito difícil e com carga negativa. No caso do Tomás, na clínica pediátrica, só há risos, barulho, brincadeira e corridas, não há tristeza - essa fica no olhar dos pais. O Tomás adora o IPO, diz a muitas pessoas: «Quando ficares doente pede para ir para o IPO porque é um hospital incrível e as enfermeiras são amiguinhas. Ah, e tem uma loja onde vendem carrinhos». Ao contrário da minha mãe, que só guarda más recordações, ele é feliz no IPO, acorda com vontade de ir para lá. Inclusive no dia de aniversário queria ir para o IPO porque fazia anos e queria estar com as enfermeiras e os meninos. Mostra que é possível ser feliz com a doença".

Os tratamentos, para já, estão a "correr bem", e os últimos resultados do mielograma mostraram que João Tomás já não tem doença detetável. "Estão previstos dois anos de tratamento e depois a vigilância. A fase que mais aguardamos é a última, porque deixa de estar em isolamento e pode voltar a estar com os amigos e a sair de casa", constatou.

Apesar de tudo, nesta primeira fase, a família tem estado em casa, indo ao IPO para exames, consultas e tratamentos. "Acho que a felicidade deveria fazer parte do tratamento. O mais importante é ser feliz sempre, mesmo durante os tratamentos. O que mais alegra o meu filho é a música, dançar e futebol, por isso, se for preciso teremos sempre música alta, dançaremos os dois e haverá sempre uma bola de futebol próxima dele", realçou.

"Às vezes sinto que mantenho o meu filho em 'prisão domiciliária' e ele não tem culpa"

O "isolamento" é uma das partes mais difíceis para esta família, principalmente porque o pequeno João Tomás é uma criança "com muita energia" e "muito alegre". Não poder ir a aniversários de amiguinhos, não poder jogar futebol e brincar é "muito difícil" e Joana admite que "é muito difícil impedir uma criança de ser criança, de brincar e de estar com os amigos. Às vezes sinto que mantenho o meu filho em 'prisão domiciliária' e ele não tem culpa. No fundo ele percebe e tem muito cuidado, fala do cancro como algo normal, ou seja, a doença não o afeta, o que nos dá força. Impedi-lo de ser criança é o que mais custa. Tenho muito receio que se esqueça e/ou se esqueçam dele pela falta de convivência, que se torne numa criança/adulto isolado e que só queira estar sozinho quando ele, neste momento, adora o convívio e estar com pessoas".

Joana é mãe de mais um menino, com um ano e meio, o pequeno Pedro. A gestão "não é fácil", mas conta com a "ajuda do pai e dos avós. A minha mãe tem sido o meu pilar neste caso, ajudando sempre que pode, não sei como iria conseguir sem ela. E claro, a ama do Pedro, a D. Rosa, que é muito prestável e, como o trata tão bem, sinto-me mais descansada. Aproveito para estar com o Pedro ao fim do dia quando o pai chega do trabalho e passa a estar com o Tomás".

"Aceitar é o mais importante"

A todas as mães que estejam a passar por esta batalha "difícil e injusta", Joana Leitão afirma que, por muito que custe, "aceitar é o mais importante. Não tivemos culpa nem pudemos fazer nada para mudar, apenas garantir que o tratamento e cuidados são cumpridos e estar sempre com um pensamento positivo. Uma das coisas que me ajuda é pensar: os casos com final feliz estão em casa e um dia também iremos para casa e não precisaremos estar sempre a ir para o IPO".

Falar é algo também "muito importante", segundo esta mãe. "Não guardar só para nós o que nos vai na cabeça. Falem com quem quiserem, mas falem, desabafem. Não temos de ser fortes sempre e falar, pelo menos a mim, ajuda-me. Uma outra coisa importante é pedir ajuda. Claro que, devido ao isolamento, têm de ser os mais próximos. O pensamento principal tem de ser a cura, "TUDO VAI CORRER BEM!" e o mais importante é a criança ser feliz, mesmo durante este caminho", frisou.

Joana não esquece todos os que a ajudaram e continuam a ajudar neste momento menos bom, deixando um agradecimento "a todos os que nos ajudam e se lembram do Tomás, toda a família que o visita ou liga regularmente", e um "obrigado especial" ao "Dr. Tiago Branco, pediatra do CHTS e à Dra. Carolina Curto, pediatra do CHSJ, assim como a toda a equipa de Clínica de Pediatria do IPO, tanto hospital dia como internamento que são extraordinários com ele. Aos voluntários da Liga Portuguesa Contra o Cancro, principalmente à Célia, à Tatiana e à Mafalda que o Tomás tanto adora. À Associação Acreditar, nomeadamente à Carolina, por ser tão prestável. Aos condutores da Damos Vida, principalmente ao Sr. Júlio e à Lili, que o Tomás diz serem os melhores amigos – tornam as idas para IPO e para casa numa animação e transmitem muita leveza. À Dra. Cristina Costa que o acompanha desde o início e ao Dr. Diogo Soares que nos tem ajudado muito a ultrapassar estes momentos menos bonitos", descreveu.

Joana Leitão deixou ainda uma mensagem aos patrões "que têm sido incríveis, compreendem e preocupam-se com o Tomás. Aos meus colegas de trabalho e amigas pela força que me dão. A todos os amigos do Tomás que vão mandando mensagem, fazendo com que ele fique feliz por não se esquecerem dele. E, claro, ao Centro Escolar de Vila Boa do Bispo, nomeadamente ao professor Amadeu, que é incrível com o Tomás e permite que tenha aulas em casa, apesar de nem sempre ser fácil conciliar com todas as idas ao IPO".

Por fim, Joana Leitão afirma que "o cancro não trouxe só coisas más, mostrou-nos que há muitas pessoas boas neste mundo e transformou os nossos dias em dias de muito, muito amor. Acredito que tudo acontece por uma razão e se devemos tirar alguma conclusão disto tudo, a conclusão é essa: olhar para o mundo com outros olhos, há muito amor para dar e receber".