Nascida numa família de feirantes, e ainda muito nova, Andrea Queirós arregaçou as mangas, vestiu a farda e pôs mãos à obra, ou melhor, nas farturas. Com apenas 20 anos seguiu os passos da família e criou e seu próprio negócio. "Somos quatro irmãos e todos temos negócio, mas farturas só eu é que tenho", conta.
Há 24 anos nasceram as "Farturas Micaela", o mesmo nome da "única filha" que tinham quando adquiriram a roulote. Na altura, a "apreensão" tomou conta do casal, porque eram "muito jovens", mas o negócio foi "evoluindo" e, desde então, tem sido o sustento desta família da freguesia Penha Longa e Paços de Gaiolo, do concelho do Marco de Canaveses.
A Andrea e José juntam-se a funcionária Maria, a filha mais velha, Micaela, "que se formou, tem o trabalho dela e vai ajudando de vez em quando", e a mais nova, de 17 anos, Fabiana. "Por enquanto, está connosco a ajudar, mas quando acabar o 12º ano está a pensar seguir a universidade, o que não quer dizer que não continue a trabalhar connosco", diz a mãe.

No entanto, a experiência de longos anos levam-na a dizer que trabalhar nesta área "é muito difícil" e não aconselha as filhas "a ir para as feiras. É uma profissão digna como qualquer outra, mas por ser tão dura e difícil preferia, sinceramente, que elas seguisse outro rumo".
Viver do trabalho numa roulote implica ter "um trabalho que é sazonal. No verão nós fazemos as horas que as pessoas com um emprego dito 'normal' fazem durante todo o ano. Por exemplo, nos meses de junho, julho e agosto dormimos cerca de três a quatro horas por noite. Depois há o terra a terra, ou seja, agora estamos uma semana num sítio, depois outra semana noutro. É muito cansativo", explica.
Embora algumas dificuldades continuem a persistir, o negócio desta família foi evoluindo assim como as "condições para se andar fora de casa. Hoje em dia, temos os equipamentos para tomar o banho antes de ir para a cama, a televisão, a nossa independência com qualidade. Até aqui não tínhamos, não havia qualquer tipo de higiene, mas agora a vida já se torna mais fácil. Nos inícios, pelo menos para mim, foi muito complicado", partilha Andrea.

O que é certo é que a palavra 'rotina' não faz parte do dicionário de quem vive do trabalho de festas e romarias. "Tanto nos deitamos às cinco da manhã e até podemos nem nos deitar sequer. Isto altera a toda dinâmica familiar. Não temos um casamento, uma comunhão, um aniversário, porque estamos sempre ocupados. Na nossa família as festas, geralmente, acontecem no inverno para poder estarmos todos juntos. Somos Marco de Canaveses e procuramos fazer o que seja mais pertinho para poder ir a casa o mais tempo possível", conta.
Nesta profissão, e depois de tanto anos a dedicar-se a ela, Andrea Queirós garante que há "aspetos positivos. Gosto de trabalhar com o público, nunca tive dificuldade em lidar com pessoas, sou muito comunicativa, aliás somos todos. Quando estamos um tempinho em casa, que não se vai trabalhar já se sente a falta e o bichinho a chamar por nós. É cansativo mas no fim acaba por compensar".
No que diz respeito à protagonista desta história, a fartura, o segredo para o sucesso está na "simpatia e saber estar ao balcão", na "higiene, o que não serve para mim não serve para os outros e agradeço todas as críticas que sejam construtivas" e, por fim nos ingredientes, "um bom óleo e uma boa farinha, mas é como fazer uma panela de sopa em casa, a receita é a mesma mas nem sempre corre bem". O que é certo é que as Farturas Micaela tentam "dar sempre o melhor, com os melhores produtos e corre sempre bem".

O que também corre bem é a valorização de quem faz da roulote o seu ganha pão. Andrea Queirós sente-se "mais valorizada hoje do que antigamente. Antes achavam que era uma profissão diferente, mas agora já não há esse estigma, as pessoas já se convenceram que além daquela vida, temos a vida dita 'normal' como todos os outros: temos os filhos na escola, a nossa casa, a nossa vida pessoal. Simplesmente enquanto as pessoas têm um horário para cumprir, nós não temos horário. É o nosso trabalho, que as pessoas já respeitam e, no meu caso, respeitam-me bastante. Sinto-me realizada no trabalho que faço".
Faltam poucos dias para o início das Festas do Marco e, apesar de fazer "muitas desde a Páscoa até outubro", esta é "especial. Vamos de domingo para segunda e estou ansiosa por ela, gosto de trabalhar na nossa cidade é uma das festas que mais gosto de fazer. Faço muitas mas essa é especial", garante a porta-voz da família.
Fica agora o convite: "Visitem-nos e o que tiverem a dizer digam, aceitamos todo o tipo de críticas. Estamos cá para melhorar e nunca para piorar e só com a ajuda das pessoas é que melhoramos".