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Com o conflito na Ucrânia, são várias as pessoas, instituições e empresas portuguesas que se disponibilizaram para ajudar com recolha de bens, mas a realidade que se vive no país vai muito além da necessidade desses produtos. Ana Catarina Ferreira é de Cinfães e está na Polónia desde 2017, onde trabalha na Organização Não-Governamental europeia Europejskie Forum Młodzieży, que tem prestado auxílio na parte mais burocrática e relacionada com documentação aos ucranianos que chegam no país e apela a uma “ajuda consciente”.

A Polónia, que faz fronteira com a Ucrânia e tem “uma cultura e uma história semelhantes”, foi um dos primeiros países a manifestar a sua disponibilidade, entrando em conversações e abrindo as fronteiras, assim como garantindo, por exemplo, transportes públicos gratuitos para os ucranianos que estavam a entrar no país. Foram feitas listas de acolhimento com os nomes das pessoas que estavam a atravessar as fronteiras, que depois são divididas em grupos e reencaminhadas para os locais de acolhimento, que pode ser temporário ou de mais longo prazo.

Atualmente, a Polónia está na fase de “tentar implementar leis que possibilitem ou que facilitem os mecanismos burocráticos para as crianças acederem ao ensino aqui”, isto porque a chegada de refugiados implica tratar de documentos, mas também do seu futuro neste novo país: emprego para os adultos e ensino para as crianças.

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A organização onde trabalha não se foca na ajuda humanitária e, por isso, não se encontra nas fronteiras, mas é, sim, um “ponto intermédio” de contacto do cidadão ucraniano com o novo país. Asseguram alojamento, comida, apoio a nível linguístico e burocrático, entre outras situações.

“Muitas vezes, quando fazemos reuniões para avaliar como as coisas estão a seguir, falamos do privilégio europeu, não sentir na pele este tipo de coisas. Uma das coisas que, provavelmente me marcou e a história, repete-se muito, de jovens chegarem e dizerem que parece ficção cientifica: o pai acordá-las a meio da noite a dizer que têm cinco minutos para irem embora”, recordou, acrescentando que também há pessoas que fizeram as malas e olharam para o apartamento “e começaram a chorar porque acabaram de comprar”.

Para estes e muitos outros casos o apoio psicológico será uma ferramenta de ajuda. “A nível nacional, há apoio psicológico, quando as pessoas são realocadas também há o apoio que está sempre acionado para as situações e para o que for necessário”, explicou. No entanto, há ainda casos em que, depois dos primeiros “dias de névoa” e de perceber a nova realidade, “há pessoas que começam a pesar a possibilidade de voltar”, porque “há a saudade de quem lá ficou” e muitos não sabem o que vão fazer e não conhecem a língua.

A ajuda aos ucranianos tem-se multiplicado pelos vários países, está “a acontecer em todo o lado”, mas Ana Catarina Ferreira sublinhou que “é preciso haver a noção que a ajuda não pode ser a curto prazo, vai ser necessária durante muito tempo”, uma vez que “o processo psicológico e emocional não acaba com o cessar-fogo”.

Assim, deseja que o apoio prestado seja “uma ajuda consciente” e não só para “as pessoas se sentirem bem”. Recordou, por isso, que pensar em enviar uma carrinha para trazer pessoas não é tão fácil como parece, porque, além de serem necessários documentos, “pode alguma coisa correr mal” e, “assim que acabe a guerra, a vida delas tem que continuar de alguma maneira, a ajuda tem de ser preparada”, têm de “refazer a vida com alguma dignidade”.

“Não se preocupem se não puderem ajudar no imediato. Não vai acabar no imediato”, reforçou, lembrando que não se sabe sequer a duração deste conflito e que é importante lembrar-se dele mesmo quando deixe de ser mediático como agora.

Sobre as ajudas, destacou a financeira como “a mais rápida e a mais prática”, mas também “há muitas maneiras de ajudar”, com recolha de roupas, enlatados e bens que cheguem em boas condições. Além disso, há ainda outro tipo de auxílio que não se materializa, como é o caso de “tentar saber de oportunidades de emprego” para ucranianos e da realização de campanhas de cidadania.

Aos 35 anos e na Polónia desde 2017, depois de se ter inscrito para um projeto europeu, Ana Catarina Ferreira acabou por ir renovando sempre o “sim” à proposta de ficar na organização. Admite gostar “muito da resiliência do povo polaco”, bem como da “história brutal a todos os níveis” do país.