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Opinião
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O Saber como Mercadoria: A Nova Escravidão do Século XXI

As universidades em Portugal são como os terrenos do Vale do Douro. Ambos exigem esforço para dar fruto. Ambos têm condições difíceis, mas férteis. Ambos dependem de quem trabalha com paixão e paciência.

Redação

Nas vinhas, o solo é duro, o clima é exigente, mas o vinho que nasce é de excelência.

Nas universidades, o ensino é exigente, os recursos são escassos, mas os alunos que saem são brilhantes.

Tal como o vinho do Douro, que é exportado para Londres, Paris ou Nova Iorque, também os nossos licenciados, mestres e doutores são “exportados” para esses mesmos lugares.

Portugal cultiva, mas não consome.

Forma, mas não valoriza.

Investe, mas não retém.

É uma terra que dá do melhor, mas não o saboreia.

Na época senhorial, os corpos eram explorados para enriquecer os palácios. Hoje, as inteligências são extraídas para alimentar sistemas que não conhecem o rosto de quem pensa.

O talento é tratado como matéria-prima, e o país de origem como mero fornecedor.

A “escravidão moderna“ não tem correntes, mas tem contratos precários. Não tem grilhões, mas tem apartamentos minúsculos em cidades caras. Não tem chicote, mas tem pactos de silêncio. E o silêncio é a forma mais dura de dominação.

Quem produz o melhor vinho em Portugal ganha uma miséria porque o valor é atribuído na vitrine, não na origem. O agricultor é pago pela mão de obra e o distribuidor lucra com o luxo.

O mesmo acontece com o saber: quem forma é pago como operário, quem emprega enriquece à custa da nossa elite.

E talvez seja por todas estas razões que este ano tantas vagas no ensino superior ficaram por preencher.

Os jovens começam a perceber que investir anos de estudo, esforço e dinheiro num curso superior pode não compensar quando o retorno é um salário baixo, falta de reconhecimento ou a necessidade de emigrar para exercer a profissão.

O vazio nas universidades é o eco de um país que ainda não aprendeu a valorizar o saber que cultiva.

Professor de EMRC e coordenador de departamento no Agrupamento de Escolas D. António Taipa, em Freamunde.