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Penafiel
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Ricardo Barros: Um jovem treinador com 'queda' para as subidas de divisão

Com apenas 35 anos, o técnico natural de Duas Igrejas, Penafiel, soma quatro subidas de divisão. O sucesso chega-lhe do banco, depois de uma carreira como jogador interrompida por lesão. O FC Pedras Rubras foi o mais recente capítulo de uma história feita de trabalho, ambição e resiliência.

Redação

Da lesão à paixão pelo treino


Ricardo Barros nunca planeou ser treinador. Jogava nos distritais e representava o clube da sua terra, o Duas Igrejas, em Penafiel, quando uma lesão grave no joelho lhe mudou a vida. “Foi no menisco e nos ligamentos. A direção do clube convidou-me a treinar os juniores para não ficar parado. E aí começou o bichinho”, recorda.


O primeiro passo foi aceitar o convite. O segundo, formar-se. “Comecei a estudar, a perceber o que era o treino e o papel do treinador. Tirei o nível 1 e fiz estágio nos sub-15 do Freamunde, no Campeonato Nacional. Depois surgiu o convite do Lamoso e nunca mais parei”.


De lá para cá, seguiu-se uma escalada consistente. Subiu de divisão com o Lamoso (2016/17), Macieira (2018/19), Citânia de Sanfins (2019/20) e, agora, com o Pedras Rubras, na temporada 2024/25.

Quatro subidas… e mais ambição


Apesar do registo notável, Ricardo recusa rótulos. “Não me considero o ‘mister das subidas’. Gosto de projetos com ambição, com objetivos claros. E o meu percurso obrigou-me a isso: tive de subir para chegar à Elite ou à Divisão Hyundai. Nunca tive convites diretos. Comecei no pelado”.

Mas não esconde o orgulho na consistência. “Com 35 anos, ter quatro subidas em quatro clubes diferentes não é muito comum. Não fui jogador profissional, nem sou licenciado em Educação Física. Tive de provar o meu valor através dos resultados”.


A próxima meta está bem definida. “A minha ambição é ser treinador profissional. Este ano, até surgiu uma oportunidade no Campeonato Nacional, com treinos de manhã, mas exigia deixar o meu trabalho. Financeiramente, não deu. Mas é para isso que trabalho e estudo todos os anos”.

Uma forma de estar: exigente, mas consciente

Ricardo define-se como um treinador exigente, pragmático e atento. “Sou mais frio, sim. Para mim, cada divisão conquistada tem muito valor. Custou-me muito chegar aqui. Depende dos momentos: se as coisas estão bem, sou mais sorridente. Se estão mal, foco-me no trabalho”.


Ao longo dos anos, percebeu que ser treinador vai muito além da tática. “Hoje o jogador é diferente. É mais informado, mais exigente. Questiona, quer saber. Temos de estar preparados. Temos de mostrar convicção. Se ele sentir que o treinador não acredita naquilo que está a dizer, perde-se o grupo”.

É por isso que insiste na formação contínua, mas também na importância da experiência. “Aprende-se muito em formações, mas é na competição que se cresce. Quando tens lesões, quando precisas de adaptar modelos, quando vês que a tua ideia não está a resultar, é aí que percebes o que é ser treinador”.

“Neste projeto senti-me mais treinador do que nos outros”

O trabalho no FC Pedras Rubras teve um sabor especial. “Foi dos melhores projetos que já tive. Eu era avaliado pela forma de treinar, pelo desenvolvimento dos jogadores, não só pelos resultados. Isso permitiu-me crescer. Senti-me mais treinador neste projeto do que se calhar nos outros”.

A subida foi construída com uma ideia clara de jogo. “Somos uma equipa técnica muito ambiciosa. Trabalhamos ao pormenor o treino e o jogo. Criamos equipas organizadas, com futebol ofensivo e atrativo. Isso aproxima-nos da vitória”.

Mas Ricardo não tem certezas sobre o que vem a seguir. “O nosso último jogo foi este domingo. A SAD ainda não sabe se continua no clube. O mais certo é não ficarmos. Gosto do clube, eles gostam do meu trabalho, mas o futuro é incerto”.

“Estou a ter mais sucesso como treinador do que como jogador”

O que começou por ser uma alternativa tornou-se numa vocação. “Como jogador, talvez tivesse algum talento para estas divisões, mas nada mais do que isso. O que me arrependo é de não ter começado a treinar mais cedo”.

Hoje, embora realizado, mantém uma visão equilibrada. “Sou feliz como treinador, mas não sou demasiado feliz quando as coisas correm bem, nem demasiado triste quando correm mal. O futebol é um contexto instável, pode acabar a qualquer momento. A minha felicidade está na minha vida particular, na minha família”.

Conselhos para quem começa: paciência, formação e convicção

Apesar da juventude, Ricardo já sabe o que diria a quem sonha ser treinador. “Ainda recebo muitos conselhos, mas também já os começo a dar. O essencial é perceber que o futebol mudou. O jogador sabe muito, tem acesso a tudo. Para sermos líderes temos de ter a certeza daquilo que transmitimos”.

E deixa um aviso claro: “A formação é importante, mas é no contexto competitivo que se aprende a sério. Os cursos dão-te base, mas são as lesões, as derrotas, as adaptações forçadas que te ensinam o que é o futebol real”.

Ricardo Barros é, talvez, um exemplo raro de alguém que se reinventou e, com esforço e estudo, transformou um contratempo numa vocação.

Com quatro subidas de divisão e um discurso ponderado, é hoje uma referência nos bancos do futebol distrital. E com a ambição intacta: “Quero ser profissional. Para isso, continuo a trabalhar. Mas sem esquecer que a vida é mais do que o futebol.”