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Sociedade
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“A cria mata o criador”: filho menor da vereadora de Vagos detido por suspeita de matar a mãe

O país encontra-se em choque com a notícia do dia: o filho menor da vereadora da Câmara de Vagos, Susana Gravato, foi detido após fortes indícios de ter assassinado a mãe com um tiro.

Redação

As autoridades indicam que o adolescente terá utilizado a arma do pai, guardada num cofre na casa da família, e tentado simular um assalto após o crime.

O choque e a contranaturalidade do ato

Para Almiro Mateus, médico aposentado de Medicina Geral e Familiar, a situação é chocante e contranatura. O especialista frisou: "é evidente que é uma notícia que choca, porque não é natural que a cria mate o criador".

Segundo o médico, fatores psicológicos podem estar em causa, incluindo perturbações mentais ou mesmo um surto psicótico. Mas, alerta que o contexto educativo também é decisivo: "Até pela prática clínica que tenho, um adolescente com 14 anos... provavelmente há algum surto psicótico ou perturbação mental". "Parece-me também que deve haver uma política educacional que está muito em causa, porque agora é luxo darem permissão a tudo o que fazem as crianças, e depois elas vão crescendo e vão impondo. Nem tudo o que a criança impõe é bom para o processo educativo", assegurou.

Limites e afetos: o papel da família

Almiro Mateus sublinhou a importância do equilíbrio entre limites e afeto, explicando que "tem que haver pontes, tem que haver diálogo, valores que têm de ser refletidos em família e mesmo na sociedade". Exemplificou, ainda, que "a mão que dá também sabe tirar". Ou seja, "a mão que dá afeição também pode dar afetação. É importante que a criança veja nos pais e nos avós uma fonte segura, um porto seguro."

Além disso, referiu, pai e a mãe têm que ser assertivos. Isto é, as crianças "crescerem num ambiente em que o não é não e o sim é sim, onde não há o ‘nim’" 

O profissional frisou que o ambiente familiar e a forma como a criança é educada influenciam diretamente o seu desenvolvimento psicológico e emocional, podendo mais tarde refletir-se em agressividade ou comportamentos violentos. "Famílias monoparentais ou não convencionais podem criar alguma turbulência, que afeta o desenvolvimento psicológico e emocional da criança e mais tarde pode refletir comportamentos de violência, comportamentos de agressividade, e neste caso mesmo brutais, que levam à morte", explicou.

Violência social e responsabilidade coletiva

O médico acrescentou que a violência juvenil não surge isoladamente, refletindo fatores sociais mais amplos: "Não acredito que seja um sinal dos novos tempos. O processo educacional e até o processo social, económico e político está a ser posto em causa. Crianças e adultos com acesso a estupefacientes ou outras drogas perdem a capacidade de raciocínio". "A violência da sociedade é também a nossa violência. Nós é que pomos a nossa violência ao serviço de uma sociedade. Porque a sociedade não quer que isso aconteça", defendeu.

O papel da comunicação social e o silêncio da sociedade

O dr. Almiro destacou que, além da família, existe também um “silêncio cúmplice da sociedade”. Evidenciou que muitas crianças crescem afastadas de referências familiares e sociais: "Há um silêncio cúmplice da sociedade e também das famílias. Porque pegar numa criança, metê-la numa creche, afastada dos pais e dos avós... Cresce, vai para um centro de estudo, vai para uma escola, está ali completamente num servito hermético. Se não tiver uma função familiar importante por trás, que faça lembrar os valores, os valores do amor e os da igualdade, é evidente que depois ficamos mais frágeis e podemos acometer crimes que cada vez surgem mais."

O médico defendeu ainda que, hoje, a comunicação social tem um papel positivo ao alertar para estes problemas: "Antes existiam casos destes, mas havia pouca comunicação social que falasse deles. Hoje, vivemos uma sociedade mais aberta, e isso devemos à comunicação social. Estar a alertar não é alarmar, é alertar para que exista consciência da família e para sermos mais solidários uns com os outros."

Reflexão sobre valores e limites

O caso da família Gravato coloca novamente na agenda pública questões sobre violência familiar, limites parentais, educação, saúde mental e segurança doméstica. A arma, mesmo guardada num cofre, acabou por ser utilizada, sublinhando a importância de regras claras e supervisão em casa, sobretudo quando há menores.

Para o dr. Almiro, este episódio extremo evidencia a necessidade de refletir sobre valores, afetos e responsabilidade coletiva. Como disse, "este é um caso que choca, choca pela violência, porque um filho matar uma mãe é contranatura".