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Portugal
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Cremar ou sepultar? A escolha que alivia cemitérios mas levanta dúvidas ambientais

A cremação tem crescido em Portugal e reduzido a pressão sobre os cemitérios urbanos. No entanto, há questões ambientais e de regulamentação por resolver.

Redação

A resposta aos cemitérios lotados

Com os cemitérios dos grandes centros urbanos a atingir a lotação máxima nas últimas décadas, a cremação tem vindo a afirmar-se como uma alternativa à tradicional sepultura. Responsáveis do setor funerário apontam esta mudança como fundamental para aliviar a pressão sobre espaços que, em muitos casos, já não tinham capacidade para receber mais sepulturas.

Paulo Carreira, presidente da Associação Portuguesa dos Profissionais do Setor Funerário (APPSF) e diretor-geral da Servilusa, recorda que “antes de 2010 dizia-se que a cremação não fazia parte da tradição portuguesa”. Hoje, a realidade mudou: 25% dos funerais em Portugal recorrem à cremação, sendo que na região de Lisboa este número já ultrapassa os 60%. No Algarve e na região do Porto, a tendência é semelhante.

A sustentabilidade em debate

Apesar do crescimento da cremação, a sua sustentabilidade ambiental continua a ser debatida. Carlos Almeida, presidente da Associação Nacional de Empresas Lutuosas (ANEL), refere que, segundo um estudo francês, a pegada carbónica da cremação é ligeiramente superior à da sepultura, mas sem diferenças significativas.

“O problema é que para a sepultura qualquer coisa serve”, alerta, sublinhando que muitas urnas utilizadas para enterro não seguem critérios ecológicos. Já no caso da cremação, existem regras mais apertadas sobre os materiais utilizados, o que contribui para uma menor poluição e maior durabilidade dos fornos.

Urnas ecológicas ganham protagonismo

A exigência de normas ambientais no processo de cremação tem levado alguns fabricantes a desenvolver soluções mais sustentáveis. Em Amarante, Joaquim Castro, administrador da Joriscastro, produz urnas ecológicas há mais de 20 anos. Garante que estas não só respeitam o ambiente, como ajudam a preservar os fornos crematórios, reduzindo o desgaste e aumentando a eficiência energética.

Também as urnas destinadas a cinzas estão a ser alvo de inovação, com opções biodegradáveis e amigas do ambiente a ganhar preferência entre as famílias.

Falta regulamentação e fiscalização

Apesar dos avanços, Carlos Almeida deixa um alerta: “Não há regulamentação específica para os fornos crematórios em Portugal”. Aponta a ausência de fiscalização por parte da Agência Portuguesa do Ambiente e critica o facto de ser cada município a decidir a localização e funcionamento destas infraestruturas, sem uma estratégia nacional.

Alguns estudos indicam que três fornos crematórios podem poluir tanto como uma coincineradora. Lisboa já conta com quatro fornos, e no Algarve pondera-se a construção de um terceiro. Para Almeida, estas decisões devem ser avaliadas com base em dados concretos e critérios ambientais claros.

Tradição ou romantismo?

Com a mudança de hábitos e o crescimento da cremação, surgem também reflexões sobre práticas que permanecem inalteradas. Carlos Almeida questiona, com alguma ironia, a venda de terrenos perpétuos nos cemitérios: “Ainda se compram. Faz sentido? É romântico.”

Para os profissionais do setor, o debate está longe de estar encerrado. A cremação tem-se revelado uma solução eficaz para a sobrelotação dos cemitérios, mas é essencial garantir que esta resposta seja também sustentável e devidamente regulamentada.