logo-a-verdade.svg
Opinião
Leitura: 4 min

Literacia Económica e Política nas Escolas

Num tempo marcado por profundas transformações sociais, pela velocidade da informação e pela fragilidade da verdade nos espaços públicos, urge repensar o papel da escola enquanto pilar de formação cívica, ética e crítica.

Redação

Como professor não posso deixar de manifestar uma preocupação crescente: a ausência de literacia económica e política no currículo escolar como um dos fatores que fragiliza a maturidade democrática dos nossos jovens e, por consequência, da sociedade em geral.  

Todos testemunhamos com inquietação o crescimento de discursos extremistas, das simplificações perigosas da realidade e a proliferação da desinformação nas redes sociais. Muitos jovens, expostos a estas influências, revelam uma compreensão incipiente das dinâmicas económicas que estruturam o nosso quotidiano e das instituições políticas que sustentam o Estado de Direito. Tal desconhecimento afeta o espírito crítico e abre espaço a manipulações ideológicas que ameaçam os valores fundamentais da nossa democracia: a liberdade, o respeito mútuo, a justiça social e a responsabilidade cívica.  

Neste contexto, a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento ganha uma importância renovada. Longe de ser marginal ou descartável, como alguns defendem, esta disciplina deve ser consolidada como um espaço privilegiado para introduzir conteúdos de literacia económica e política, desde o ensino básico até ao ensino secundário. Trata-se de dar aos alunos as ferramentas para compreenderem o que é o Orçamento do Estado, como funcionam os impostos, o que implica o endividamento público, o papel do Banco de Portugal ou da União Europeia. Trata-se, igualmente, de promover a compreensão do
funcionamento das instituições democráticas, o valor da Constituição da República, os direitos e deveres do cidadão, a importância do voto e da participação cívica.    

Reduzir ou eliminar esta disciplina seria uma cedência perigosa à ignorância e ao facilitismo. Pior, ainda, seria instrumentalizá-la ao sabor das alternâncias partidárias, desfigurando os seus objetivos para se moldarem às agendas ideológicas dos partidos que formam os governos vigentes a cada momento. A educação para a cidadania não deve ser prisioneira de lógicas partidárias deve, isso sim, assentar nos valores estruturantes da nossa ordem democrática, consagrados na Constituição e partilhados por uma comunidade que se quer coesa, plural e respeitadora da dignidade humana.  

Defendo, por isso, que esta disciplina seja repensada e reforçada, com conteúdos estruturados que preparem os jovens para as responsabilidades da vida adulta. Afinal, não estamos apenas a formar alunos e alunas, estamos a formar cidadãos, pessoas. Cidadãos que terão de tomar decisões sobre o seu futuro económico, que serão chamados a votar, a intervir na vida pública, a construir a sociedade em que viverão e que deixarão às gerações futuras.

Educar para a liberdade, para o pensamento crítico, para o discernimento económico e político, é hoje um imperativo inadiável. Seria interessante pensar que, em doze anos de escolaridade obrigatória, o nosso sistema de ensino apenas tem uma disciplina focada nestas temáticas que favorecem o desenvolvimento humano e social e por isso a formação integral dos alunos.

Que a escola não falhe neste compromisso. Que a sociedade não abdique deste dever. E que os nossos jovens, com o apoio da educação, saibam distinguir o ruído da razão e escolher, com responsabilidade e consciência, o caminho da liberdade e da cidadania plena salvaguardando sempre a liberdade própria de um estado de direito democrático.  

Prof. João Soares