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Marco de Canaveses
Leitura: 7 min

Sarah Maggioli foi diagnosticada com cancro da mama aos 28 anos e tornou-se voz para outros jovens 

Fotografia de Tânia Carreira

Redação

Aos 28 anos, Sarah Maggioli viu a sua vida mudar com o diagnóstico inesperado de cancro da mama. Embora tivesse sentido um nódulo no peito esquerdo, a previsão dos médicos é que seria algo de passagem. No entanto, com as consultas de vigilância, veio se a diagnosticar um cancro de mama. “Já tinha duplicado em tamanho. Fui encaminhada para o Centro de Mama do Hospital São João, onde fiz outros exames e a biópsia foi conclusiva”. Até hoje a causa é desconhecida e embora tivesse alguns casos na família, todos acima dos 60, não parecem ter relevância. “O teste genético para a doença deu negativo”.

Ao receber a notícia, Sarah Maggioli confessa que sentiu um “choque paralisante” e medo do que ainda pudesse vir até concluir todos os exames. “Temi pela vida. Julgo que é impossível que isso não passe pela cabeça de alguém, mas, eventualmente, essa sensação passou, claro”. E a verdade é que não demorou muito para se encher de coragem e pensar em soluções. “No próprio dia iniciei o processo de preparação para a punção ovárica, recomendado pela médica de cirurgia oncológica, tendo em conta o risco de infertilidade causado pela quimioterapia”. Uma etapa que durou cerca de duas semanas e implicou uma série de injeções. Seguia-se a quimioterapia.

O colo de quem ama

“Algum choro e muitos abraços apertadinhos...” é assim que a jovem descreve a partilha da notícia com a família. O pai estava ao seu lado no dia da consulta, e mal conseguiu partilhou com a mãe, irmã e namorado. À medida que o tempo ia passando, a notícia ia se espalhando e tudo era uma aprendizagem. “Devo dizer que partilhar uma situação destas foi uma forma de ir processando. Perceber o tom certo para comunicar, ir impondo limites nas questões que as pessoas faziam, e até o saber comunicar exatamente o que precisamos do outro...”. A quimioterapia terminou no final de março. Recentemente, realizou uma mastectomia e agora aguarda indicações, enquanto recupera da cirurgia. Contudo, sendo um cancro de mama her2+, Sarah conta continuar a fazer um tratamento de anticorpos intravenoso até ao final do ano. E como foi a quimioterapia? “Os últimos meses foram os mais desafiantes da minha vida. São muitos os sintomas, sem sequer contar com os sintomas mais visuais como o aumento de peso e a queda do cabelo, sobrancelhas e pestanas - desde dores nos ossos, dores musculares, perda de memória, uma fadiga como nunca havia sentido, perda de sensibilidade nas pontas dos dedos. Saía dos tratamentos exausta e tonta, mas tive a sorte de ter o meu pai disponível para me ajudar cuidadosamente com o que fosse preciso”.

Uma experiência que desgastou a jovem, mas que a fez refletir sobre o papel do contexto social. “No momento do tratamento, estamos todos mais ou menos em pé de igualdade. Mas, a partir do momento em que saímos do tratamento, a coisa muda de figura - quantas pessoas vão para casa com os mesmos sintomas, para ficarem sozinhas, sem apoio, e vivem em condições que podem ser ainda mais penosas para uma condição física destas”, realça, comovida.

A partilha no digital

Sarah Maggioli tem 46 mil seguidores no Instagram e, embora tenha começado por processar a situação sozinha, acabou por partilhá-la. “Organizei-me e deixei conteúdo pronto para ninguém desconfiar. Tive ajuda de uma grande amiga para o fazer, que brincava muito comigo sobre o meu pragmatismo. Mas depois fi-lo porque eu própria senti falta de outros relatos de pessoas da minha idade ou com um estilo de vida semelhante ao meu com os quais me pudesse identificar". Uma partilha que gerou um impacto “maior do que alguma vez poderia ter antecipado! Senti uma onda de amor gigante, pela qual ficarei eternamente grata, mas também recebi imensas partilhas de pessoas a passarem por processos iguais, incluindo da minha idade. Além das mensagens de pessoas que foram fazer exames após verem a minha partilha. Senti o peso da responsabilidade daquilo que se partilha online".

Optar pela peruca

Uma decisão que descreve como “muito pessoal”, mas que a ajudou na autoimagem. "A verdade é que as mudanças visuais são impactantes. Se, até assim, me confrontei com olhares de pena e comentários sobre a infelicidade da minha situação, não quero imaginar quão mais frequente seria se tivesse assumido esta imagem no dia a dia. Sinto que é uma forma de me sentir ‘eu’ num processo que nos rouba tanto de nós. Como continuei a trabalhar, foi também uma forma de gerar menos impacto visual e de disfarçar a situação para as pessoas com as quais ainda não tinha partilhado”.

Para encerrar a entrevista, Sarah Maggioli quis deixar alguns conselhos: “Façam os autoexames! Descobrir esta doença cedo é meio caminho andado para que as coisas corram bem. Depois, para quem tem pessoas a passar pelo mesmo, diria para ouvirem o que a outra pessoa precisa. Compreendo que as pessoas queiram ajudar, mas o importante para mim tem sido o saber que os/as amigos/as e familiares estão lá, sentir-me validada, acolhida e ouvida. Por fim, deixo uma reflexão baseada num dos meus livros favoritos do Viktor Frankl (“Man’s Search for Meaning”) e que me tem acompanhado muito neste processo. Essa reflexão é que, mesmo face a uma situação difícil como esta, temos sempre margem para decidir como queremos responder. Ou seja, não é a doença que nos define, mas sim como a queremos encarar: Quando não podemos mudar uma situação, somos desafiados a mudar-nos a nós mesmos”.

Instagram Sarah Maggioli